domingo, 30 de dezembro de 2007

Fluidos...

Foto: Bruno Abreu


Um ano, como muitos outros, de vários acontecimentos felizes e alheios a tanta felicidade.

Como se não houvesse outra maneira, as coisas transcorrem dentro do caminho, do previsto e se escondem em caixinhas de surpressa imprevisíveis.

Assim, chegamos aos últimos suspiros de dois mil e sete, e ele não vai tarde, pois nada nem niguém se esvai antes do tempo, fora da hora. A vida transcorre como em ficções de cinema e barbarisa com outros efeitos tão reais. E tudo se pinta de branco, vestindo roupa nova, calsinhas coloridas e tantos feitiços fantasiados de simpatia, como se pudéssemos mesmo, de uma a outra, pincelar a energia para o futuro, quando ainda cremos nisso.

Superticiosos ou não, e para aqueles que aqui estão, vale a celebração, seja ela qual for, nas praias do nosso litoral, nas ruas dos centros das grades cidades do mundo, na roça, na cama, aos sons de música que transam um transe no corpo de alguém, nas muitas vibrações e desejos de que ele venha realmente enfeitado de bons fluidos e muitas alegrias.
Não tirando os pés do chão, nem esquecendo a cabeça nas nuvens, porque o tempo, acima de tudo é a única mudança constantemente infinda... E nós, dentro do curto espaço silencioso dentro dele, nos cabe o desabrochar como flores em suas várias estações, adormecer na sabedoria da semente guardada na terra árida de nossa vegetação. Como crianças que brincam no mundo.
E vivendo nos mostramos inacabáveis, como barulhos da inocência jamais esquecida na gargalhada de uma criança.

Eis o tempo novo, que só nasce dentro da gente...

E para esquentarmos os tamborins vale qualquer rito, seja em forma de lista de projetos organizados para o novo ano, seja a limpeza de todas as tranqueiras empilhadas no canto da casa, ou nos textos que nada mais dizem de importante jogados ao Deus dará. Nos livros já lidos e relidos, e na teima interrogante do saber... Nas promessas de mudança, nas muitas formas de pensamentos abismados em nós e todas os pertences que não nos cabem mais. Todas as velhas roupas estampadas e coloridas, todos os mitos e fadigas de um tempo em seus últimos suspiros de tentação.

Depois disso, a flor pra Yemanjá, o abraço inteiro, a ressaca do dia seguinte intercalada em nós.

Luz aos homens de bom coração.

Feliz Ano Novo!


eliz pessoa

terça-feira, 18 de dezembro de 2007


É quase chuva, e os ventos anunciam movimento nas cortinas daquela casa.

Eu bem poderia, faria, diria, insistiria, remontaria, removeria montanhas para enxergar do outro lado daquela fantasia, daquele pequeno espaço que a criança presumiu existir ali, onde o sol se insinua. Mas preferi ficar vagando em meio a pensamentos sacudidos pelo vento, que suponho ser macho, pelo artigo que o defini antes de o ser.

É noite e a terça-feira se expande sobre as linhas do parágrafo, quando alguns loucos não arriscam versos novos, para não acertarem a lucidez. Lúdico, o movimento da cidade move o vento, que move moinhos nos montes de Cabo Frio. E atrás de mim, o áudio televisivo reclama outras tecnologias, e o auxílio de uma garrafa de cerveja, esclarece outras aliterações.
Eu não sei bem onde foi parar àquela velha roupa colorida, desbotada em mim.

foto: internet


: : eliz : :

sábado, 8 de dezembro de 2007

Tapiocas na Capital da "Federanças"

fonte: blog Marcelo Katsuki


Ele morou seis anos em São Paulo, ela nasceu em Brasília.
O fato é que, naquela noite de sexta-feira, eles, resolvendo fugir do agito, optaram por um rodízio de tapioca. Escolheram a mesa, sentaram-se e aguardaram o atendimento.

Um minuto, dois minutos e três minutos separavam a espera do atendimento.
Ele reclama pra ela do atendimento “desatendido”.
Ela, por outro lado, já estava acostumada.
Ele sugeriu uma aposta de que a pizza do Forno Penedetto chegaria primeiro à mesa. Ela responde que não é para tanto.

Enquanto ele arrisca uma aposta, ela alimenta os sentidos, quando a atendente se aproxima, com um bico nos “beiços”, trazendo um frágil papel toalha “delicadamente” amassado sobre à mesa, como se tivesse limpando uma frigideira engordurada.
Eles se olham atonitos e resolvem impregnar de grafia o papel toalha mal amassado.

Ele escolhe os pedidos de números: 20 e 21.
Ela escolhe o 6, e um seis e decide por outro número, quase geminiano.
Ele pensa na sede, ela gosta de cerveja.

Os dois querem saber as opções de marcas.

Eles só tem Skol e Bohemia.

Ele pergunta pela long neck, e a atendente responde que tem long “net”.
Eles se animam em provar o sabor da nova cerveja. De repente, a Bohe-mia, aqui me tens de regresso...

Ele se diverte com a long “net”, ela o censura arriscando a primeira pedra para o último erro. Até porque ela chama de Jung de “Iung”, assim como ele chama “Freud” de “fróide”.

Os olhos dele se alegram com a chegada das tapiocas, esquecendo da solidão do estomago vazio.

Ela redige, enquantos as garçonetes tecem intrigas laboriais.
Atendimento disfalcado, versos e fome zero.

E roda uma, rodam duas e rodam três versos sobre o prato nordestino.
Satisfeitos, eles resolvem matar o texto, antes que o texto eliminem-os de vez.


: : eliz : :

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Ela


foto: Rafael José Rorato


Ela vinha subindo a ladeira com sua sacola rasgada sobre as costas já fadada pelo tempo, anos de muitas velas apagadas. Coluna sobre o efeito árduo da gravidade que não poupa ninguém.
Torta, esquiva, quase beirando o rumo do asfalto.

Nas ladeiras de Ouro Preto, suas pernas arriscavam um ato falho, lento, maltratado pela vida. Procurava com seus olhos, que pareciam só avistar o chão, latas de cervejas jogadas ao Deus dará pelos jovens estudantes, vindos de todas as partes do Brasil, repartido de tanta melodia.
Sua sobrancelha não mais conseguia levantar as pálpebras com a força do músculo da testa, e como quem já aceita as regras ditadas pela empulheta do tempo.
Baixa, pequena, velha e cansada e acometida pela certeza de que ainda assim, sua missão erguia-se latente, não desistindo num corpo cansado, na certeza da vida que arde clamando pela sobrevivência. Ali, no turismo devastado de horizontes montanhosos, próximo a Praça Tiradentes, subindo a ladeira do invisível, onde os fantasmas inconfidentes conspiram outras rebeliões.

Eu, diante do fato ativo de um corpo passivo, parei fisgada pela imagem comum de todos os gêneros, afoita nos olhos que fotografam a vida como ela se pinta, curvando-se em vias de prosseguir. História repleta de caminhos de nossas vielas estreitas. Tão cheia de nós.

Ela agora é apenas um retrato curvado nos paralelepípedos da antiga Vila Rica, além de uma lembrança registrada pelo modernismo dos tempos fast-food.

: eliz :

domingo, 25 de novembro de 2007


foto: eliz pessoa


Escreva um verso novo e observa as nuvens que desbravam horizontes ligeiros escondendo o céu de noite clara. E nas ruas silenciosas das duas horas da madrugada, as luzes intermitentes dos semáforos, inauguram as cores da madugada.

Silencia o rádio, um texto declina a palavra, manobrando o rascunho de uma entidade esquecida.

Vai! Arrisca o risco na frase, na beira da língua e mingua outra corrente de um pensamento contínuo.

Depois pare e respira o silêncio de uma palavra escrita e "rediga", "rediga", "rediga..."

: eliz pessoa :

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Ouro Preto

foto: eliz pessoa



Ouro Preto, antiga Vila Rica dos, até então, anônimos da Inconfidência Mineira.
Cidade preservada no útero das montanhas, de horizontes que se escondem por traz delas, levando longe o pensamento de quem vive na gestação incubada no ventre de sua História. De casas de estilos Barroco e Colonial, em suas ruas de paralelepípedos massageando a sola dos pés que não são daqui, exercitando a firmeza das penas do alto de seus “pelourinhos” mineiros.

Ouro de “tolo”, doentes mentais que envelhecem em sua densa energia, frutos, muitas vezes, de casamentos consangüíneos, loucos de todos os gêneros transitando nas ruas apertadas da cidade. Por aqui os fantasmas passeiam assombrando o caminho, não só da História, mas acima de tudo, de muitas energias não digeridas pelo tempo.

Os índios foram os percussores, a base do lugar, os primeiros donos do território, mas deletados pelos brancos, no poder do domínio da coroa portuguesa. Depois a ordem da exploração do ouro da região, terra brilhante, cobiçada por mentes ambiciosas. E quando a notícia se espalhou, a cidade ficou pequeno pra tanto alarde. Exploradores e explorados, brancos e negros, nobres e pobres tratados como podres. Negros escravizados, torturados, mão-de-obra escrava, tratados como inferiores, maltratados por sua cor natural, encarcerados em senzalas localizadas debaixo das casas, como animais europeus. Tendo como diferença os fins.

Lá, na Europa, os animais ficavam debaixo das casas para garantir calor, aquecer os proprietários do clima europeu. Aqui, sobre as rédeas da linha do Equador, a finalidade era outra, oprimir, suprimir, sufocar, cagando em suas cabeças, como se fossem meros animais sem humanidade.

Fatos que a História não dissipou de nossas entranhas, nem o tempo arrancou de nós todas essas mazelas, em plena confusão das muitas raças que nos tornamos, nos muitos “brasis” que nos criamos, com véus de uma educação disseminada por textos mal contados nas escolas.

Por aqui, o passado ainda é presente, ainda grita de dor, conta histórias, dentro e fora de museus e igrejas, nas veias da arte do homem doente, compulsivo por seus detalhes trabalhados no Barroco, cheio de anjos, arcanjos, impregnado de um cristianismo católico exacerbado e soberano, como a verdade absoluta e muitas mentiras estagnadas.

Templos de hipocrisia e ostentação, onde somente os ricos “nobres” do alto clero eram enterrados nas igrejas, com direito a número e sepultura, onde o mais próximo do altar era também o mais rico, e assim sucessivamente. Até hoje preservados debaixo dos pés de turistas.

Nas igrejas onde os negros não pisavam por serem negros e escravos. Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, erguida por mãos escravas para dizima esse apartheid. Os estudantes dão graça e juventude às vielas da cidade, trazendo novo ritmo a vida por aqui, rebolando nos bares e nas ruas para descolarem o caminho.
Trazendo sons de novos carnavais e tentando amenizar o ritmo das lendas.
Museus, artistas sacros e cosmopolitas, hippies, riqueza de ouro e detalhes, frestas do Iluminismo, Joaquim, Aleijadinhos, Tomás-Antônio (s)-Gonzaga (s), Marília de Dirceu, mortos, vivos, forcas, pedaços esquartejados da História, Minas que geram montanhas, neblinas que geram imagens destorcidas, carros antigos, jeitinho mineiro, distâncias, atalhos, precipícios de esbarrões no agora, cheio de “causos” e contos murmurando segredos, conspirando fábulas, decretando sentenças, arriscando golpes, massageado dúvidas, assustando a coroa, dilacerando a palavra, construindo a História de contextos que se findam, ressecando o parágrafo. Aqui, a verdade não tem um nome, mas vários.
A Inconfidência Mineira condenou um para entrar para História, exílio os outros e sumiu com uma porção da leva conspiratória. Assim como ditaduras que militaram outros tempos.

Ouro Preto. Retratos de uma Vila Rica de História.
“Ouro de Tolo”, paisagem das Minas Gerais.


: : eliz : :

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Breve, breve Ouro Preto...

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Crepúsculo



foto: Luiz Caçador




Todo final de tarde (como ousaria alguns escritores), no crepúsculo, é quase sempre assim, ele começa a cantarolar seus semitons como se fosse um Luciano Pavarotti sobre o palco de uma cena da ópera mais “glamorosa” da Itália.

Ele é miúdo, tão pequeno que chega a caber na palma da mão, mas o esforço que faz para afinar as cordas vocais é tão sincero, que o peito, enfeitados de pena, estufa como se fossem estourar numa próxima nota desgarrada.

Definitivamente, ele faz à mesma coisa, quase todos os dias. Como se, os dias todos fossem iguais, com as mesmas questões infundadas.

Interessantemente, do outro lado da árvore, sentado à beira das entradas de supermercados, os cães também arriscam outras “sempre”, amarrados a coleiras enquanto seus donos assumem os seus papéis de consumidores nos finais de tardes. Quando a nossa economia agradece, amadurecendo o ato novo, quase tardio.

Aqui na margem esquerda do micro, o autor bem que desejou um escrito em folhas de papéis em branco, só pra ver as formas da caligrafia preenchendo o vazio de um A4 qualquer. Se bem que de qualquer ele não tinha quase nada, depois que o desejo do texto almejou os olhos nele.

São quase dez minutos para as dezoito horas de uma tarde de terça, e nem tem feira exposta nas ruas da cidade.

A falta de educação dos motoristas, e o excesso de poder subindo às cabeças dos habilitados dão formas às regras infringidas do texto. E uma raiva, camuflada de Pateta, num desejo das antigas de meu tempo, encarna no corpo de alguém, como se tudo fosse possível no momento de raiva derramada sobre a fúria do volante. Velozmente o parágrafo prossegue, ainda que seja grave a greve dos roteiristas americanos. E o mundo divulga as imagens do outro lado da América.

Não me importo quase nada com tudo isso, e o quase, abrem espaço para um caixa de surpresa cheio de mistério. Quase presto atenção ao fato ocorrido.

Silenciosamente uma lista de Shindler aparece no MSN, e os animados bonecos coloridos adormecem enquanto o mundo gira.

Já é tarde, e esse dia nunca mais voltará as nossas existências, porque passará e deixará àquela íntima sensação de que nunca existiu de fato. Foi como um algo não vivido.

Porque, por aqui, o passado é apenas um sonho, que, às vezes, enche de saudades, noutras é menos singular que a única verdade, presente agora. Bem aqui, onde tudo acontece num piscar de olhos, no descuido do segundo perdido.


: : eliz : :

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

foto: (anônima)


Por enquanto as cordas vocais de nosso Cartola, tecem de carícias a melodia de um som vasto de sentimento, de imensidão, calando os delírios da noite, a atmosfera do pensamento, a raridade do momento, incío de tudo. O cheiro da última chuva, canta outras sensações, causando na gente, cheiro de mato.

Como nos sertões, nós também fazemos festas de boas vindas às águas que lavam a alma da cidade ressecada.

A inaguração de um novo bar, na Asa do norte, enchem de especativas os corações dos solteiros, como se, de uma hora pra outra, o encontro acontecesse em cada um de nós.

Mas ela desce a escada como se fosse gente, civilizadamente.
A pomba, toda feminina, assalta os olhos da primeira pessoa do singular, de ares igualmente femininos.

Um triz aproxima países latinos, e a Argentina exerce outro fascínio sobre os ouvidos, e uma ância de um vinho nas esquinas de Buenos Aires, depois a sensualidade de um Tango, arrepia resquícios de meus pensamentos.

A plenitude da mudança nos afasta da eternidade, o mundo gira quando alguém dança.

São tantos quereres amortecidos por aí, e tanto exercício na prática das coisas.

De repente, não se diz mais nada, porque a palavra tornou-se vazia, sem fundos de poço, sem restos de sabedoria, e a denúncia dos atos enfeitiçam cada minuto, sem que percamos tempo tocamos a vida, com a urgência de um tempo hábil.

Muitos parágrafos não sintonisam rádios de estações perdidas, e ainda assim, outros sonhos são replantados sobre os dias em negrito da cidade.

Ah, mas essa simplicidade, perturbada pela impaciência do corpo é que entorpesse o últimos minutos que camuflam o sono.

Por enquanto, tá tudo assim, meio dormente.

: : eliz : :

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Um desenho...


Foto: Internet

É porque ela se vê dentro dos olhos dele, quando ele se deita sobre meus seios, depois silencia a língua nas gotas salgadas da saliva. É quando acordam nos sons alegres de passarinhos, tons e semitons regem a melodia do dia.

De outra forma, um samba da viola de um Paulinho, invocara a manhã por inteira, enquanto um café é posto sobre a toalha vermelha da mesa.
É domingo, pé de cachimbo.

Mas ela havia (mesmo) jogada nos braços do mar do Arpoador, todas as despedidas do um tempo farto em si, como poemas que nos deixam sozinhos sem dizer adeus.

A lista (agora) não mais de supermercados, rabiscada de novos desejos embrulhados em papel de caderno, cuidadosamente dispersa ao mar, doadas nas mãos de Yemanjá, recebiam um coração de Oxóssi.

Entregue as curvas da cidade maravilhosa, ela já o esperava, mas ele a encontraria quando seu coração tornara-se um nobre vagabundo, como anjos que despencam do céu. Se bem que ela já não acreditava em asas quebradas.

Em forma de desenho, ele a encontraria numa esquina de uma cidade qualquer, bem longe dos braços rendidos do Redentor.
E assim, um sentimento se fez em rabiscos e a palavra emudeceu o pensamento.

Eles se encontraram e foram perdendo o medo do escuro, da rua vazia, das distâncias não galgadas, das multidões repletas de solidões que se acompanham em si, da casa calada, dos outros amores infundados, dos receios carregados, das horas e horas de indiferença que os dias pintaram em palavras.

E assim, uma nova dança uniu dois novos corpos, como peças que se encaixam, fundem-se, fodem-se e findam-se no encontro de almas.

Por enquanto, seus mais sinceros desejos foram compreendidos pelos os sons do universo. Agora eles conspiram a construção de uma nova poesia, redigida de toques, linhas de mãos e labirinto dos dedos.

O encontro criou o caminho e alguns laços viraram presentes enfeitados dentro de uma caixinha de surpresa. Quando a vida pediu passagem, eles aceitaram o convite proposto dia-a-dia.

Um novo livro supõe novas existências, partindo do princípio chamado agora.

Já é segunda-feira e há tanta poesia lá fora.

: : eliz ::

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Cadê os óculos do poeta?

foto:
Carlos Levistrauss


Nos buracos da cidade transitam ratos, baratas, “baratos”, insetos, incestos, felinos, até alguns calangos trocaram a liberdade do gramado cerrado por ares do submundo urbano. Como no fundo do mar, debaixo das metrópoles, um novo mundo, vivo debaixo de nossos pés.

Em meio ao caos, a vida se expande e deita-se na grama, sobre o sol raso dos dias quentes. Enquanto o trânsito orienta os sentidos, outros ouvidos carecem de música.
Os mp3 enfeitiçam a paisagem que passa e num instante as avenidas parecem saídas de um filme de cinema.

“Cansei de ser duro, vou botar minha alma a venda” canta o caçador, cansado de ser caça. E a Yôga, ainda assim, alonga a coluna do indivíduo, estreitando os laços da energia bloqueada na loucura dos dias.

Muitas morenas desfilam suas feições nordestinas nas asas abertas da cidade. Reflexo da genética abrasileirada. À flor da pele, um samba descompassado de Almir Guineto traz memória de um Chacrinha envelhecido nas tardes de sábado. E o carnaval ainda nem pintou por aqui.

Sem muitas palavras, o olho de um anônimo, observa a vida que lida na gente.
Sutilezas na nuca das meninas lá fora, intenções denunciadas pelos gestos, enquanto a mão do faxineiro alisa a pele da parede.

Limpidamente, o bloco vai ficando mais bonito, trabalhado pela forma das coisas.

Por aqui, poucos corintianos exibem suas camisas de uma nação supostamente democrática. Suspeito de tudo isso e ando (sinceramente) com medo da polícia, sem (ainda) fazer coisas “erradas”. Depois, desconfio de qualquer conversa de Jornalista, enganando como a torcida dos caras.

Paraliso a leitura do jornal de uma banca qualquer, pois transformaram o trabalhador morto, num mau elemento “graças” a eles, menos um no sistema.

Algumas vertentes aumentam o grau de minha miopia, e ainda assim, nego o uso das lentes de vidro, porque por vezes nem quero enxergar melhor. Como Drummond nas calçadas, descalçadas pelos gringos europeus que visitam o país das mocambas, mulatas de bundas redondas. Depois que roubaram até os óculos do poeta. Talvez nem ele queira ver no que nos transformamos.

Mas ainda cabem processos galgados pelas pernas que correm dos bandidos, como “Trainspotting” de um filme assistido.

Ando tão a flor das ruas, que qualquer cena desvairada me faz pensar...

Mas devolvam ao Drummond os óculos, pois ele já não enxerga mais, além de tudo que avistou em sua poesia: “Existe, existe o mundo apenas pelo olhar que o cria e lhe confere espacialidade?” Concretitude das coisas.

Em meio a tudo, falácias...

:: eliz ::

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Coração

foto: Rui Soares


Meu coração bate, rebola, depois dança ao som de muitas canções.
Meu coração é tão pequenino e cabe tanta emoção, outros esforços físicos, pulsações.
Nele, o mundo se encontra como nas ruas da cidade provinciana.

Meu coração é tão vadio por isso mesmo poeta de múltiplas rimas, ritmos e prosas.
Meu coração é carioca, brasiliense, nordestino, labirinto estranho no raso do peito.

Meu coração nunca foi meu, nunca teve dono, apenas se perdeu quando outro nele se encontrou.

Latino, latido, perambulando lá fora.

Meu maior tesouro, minha menor miséria.
Minha poesia, meu nada.

Meu coração é um porto sem rumo,
Um forte abandonado,
Uma estrela cadente perdida no escuro da noite,
Encontrada nos olhos delas.

Meu coração não é um coração, mas um músculo repleto de saudades...



:: eliz ::

sábado, 20 de outubro de 2007

Latejando saudade...

Ele havia me pedido um livro para guardar de lembrança da poetisa,colega de trabalho.
Eu havia dado minha palavra em entregá-lo quando exemplares chegassem as minhas mãos magras.

Mas ele também era um poeta, cheio de fislosofias, frases feitas, provérbios, bom humor lapidado pela vida, vasto coração cearense. Como tantos brasileiros, trabalhador, pai de três filhos muito bem amados. Acima de tudo, alguém que a vida, por alguma circunstância, colocou no nosso caminho. Peça rara, original, autêntico em sua essência cheia de alma brasileira.

Eu não sabia que uma ruptura o tiraria do meu convívio assim tão absurdamente estúpida, como uma lança cortando nosso carne. Mas como ele a pólvora de nossa polícia mal preparada, foi o estupim que levou sua vida de nosso vivência.

Amargamente ele partiu ontem, no entorno torto dessa “ilha da fantasia” que se tornou Brasília.
E os lados planos das estatísticas gritam todos os dias calando Chicos, Joaquins, Josés, Marias, Antônias, rasgando a poesia que vive nessa gente, comum de todos os gêneros, cronicas de nossas ruas no dia a dia.

O Estado já falho, provou sua incapacidade nos seus senhores da lei. Deslealmente o arremataram a queima roupa, em plena sexta-feira, onde ele dizia que queria tomar uma cerveja pra celebrar a semana posta.

Estranhamente, eu havia na quinta-feira xerocado uma cópia de um texto da também cearense Raquel de Queiroz – Emigrantes, onde a escritora dissertava um pouco da colonização do Ceará de onde ele foi fruto, filho nato das raízes da terra.

Bom humor, piadas latejando na ponta da língua e um jeito de olhar a vida com uma certa sabedoria de quem já passou por muitas provações. Corajoso por luta, nunca abaixou a cabeça nem se acovardou quando ela o chamou para a lida.

“Pequenino (batoré), cara de índio, entusiasmado, cabeça chata.” Brasileiro.

Hoje, arde a perda, a dor de amigo querido, do qual tive o privilégio de dividir bons momentos, muito trabalho e o um carinho tão especial, acima de tudo sincero.

Ao meu amigo de trabalho, querido Nonato do Ceará, sangue de minhas veias também cearense, a minha mais sincera lembrança e a grande saudade latejando no peito quase adormecido pela dor.

Seu livro (prometido) virou poesia e minha eterna admiração...

Vá com Deus... E aqui, fica sua lembrança descontraída.


foto: Internet (anônima)


: : eliz : :

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Sangue, suor e palavra



Foto: Internet




É o cheiro da pele na pele, outros absurdos.
Dedos escorregando os fios de cabelos,
Malícia revelando rabiscos e desejos.
Devassas palavras ejaculadas no ouvido...

Corpo nu auge da noite,
Sabores experimentando segredos,
Pêlos e pernas entrelaçadas,
Sensações desvairadas,
Olhares invasores,
Afã de desejo

Umidade latejando sentidos...

Mãos desavergonhadas e sons de Zeca Baleiro:
“feliz ao lado desse bom divã”

Horas no outro, saliva de sêmen, sabores apimentados em nós.
Oráculo de prazeres: sangue, suor e palavra.
Língua no seio lambido... Por entre pernas, corpo no corpo.

Atmosfera escancarada, vento da noite encontrado em nós.

E o mundo adormece, onde o corpo se encontra.

Mas fica mais um pouco, antes que o dia amanheça?



:: eliz ::

segunda-feira, 15 de outubro de 2007


Dentro de mim há uma Bahia,
outro Recife,
um Rio correndo livre
envolto por montanhas de ares femininos.

Dentro de mim, pulsa tambores de carnaval,
folia de rua, cores e alegrias...

Dentro de mim há um Brasil festeiro,
confusão generalizada e muitos reboliços...

Por aqui a vida pede passagem,
depois passa deixando ratros nas ruas da cidade.

: : eliz : :
foto: Pedro Moreira

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Eu sou de Oxóssi

É essa sensação cravada nos rascunhos do peito, quando todo "controle" se expande no decorrer dos dias, causando impressões ligeiras de traquilidade.
Tudo parece amortecido pelos atalhos da lida.

Mas o tempo, também nos engana virando páginas mais páginas dos dias. Reencontrando tardias vontades como se elas nunca houvessem transcorrido.

E respeito cada uso da palavra, cada estrela vaga, cada vírgula que tropeça o caminho.

Depois não há mais nada, pois não entendo mais nada e perco a sábia ignorânia do desconhecido, lançado aos braços da vida - roda de ciclos, imperfeitas purificações nas muitas ondas do salgadas do Atlântico, onde os olhos recordam saudades...

Mentalizo e ofereço uma oração à rosa recolhida pelos braços do mar.

Mas eu sou de Oxóssi, da caça e fartura "caçadora de uma flecha só" de São Sebastião do meu Rio de Janeiro, São Jorge de um coração guerreira. Por isso mesmo, não me canso e não me deixo nas argruras do peito.

Sou da luta, mesmo quando a poesia se derrama nas escadas da calçada, ainda quando tudo parece rendido nos vastos sorrisos de mentes cansadas.
E arrisco um risco novo, transformo o caminho e me rendo quando a noite cala.

Há tanta vida na gente e a gente se esquece disso...

: : eliz ::

foto: Rui Pedro Santos Duarte

sábado, 6 de outubro de 2007

Há tento tempo...


foto: Ana Franco



Porque a palavra quando não basta, serve de apoio à ponta da caneta gasta.
E fica difícil contar o que não se sente, o que não se experimenta na gente.
O risco admite as nuances do caminho, mas ainda te canto, mas não de conto acentuando sensações.
E hoje os Beatles te resgatam de um naufrágio musicado em mim.
Mas, se bem que, depois que o tempo mudou a alforria das coisas, esse som impacienta-me o ouvido.

Faz tanto tempo que a gente deixou algo esquecido, recolhido nos resquícios de uma só lembrança...
Como a roupa esquecida no varal de fora da casa, na pressa descritiva dos dias, meses, e que alguém levou, sobrando aqui dentro a vaga sensação do vazio.
Há tanto tempo, que eu já devia ter te esquecido, como a última palavra vaga ao final da linha.
Depois de tudo, o prêmio, resistindo a certeza do carinho, e os ruídos de Hendrix que naufragam você.

Numa estúpida velocidade, as mudanças cortaram a passagem de pés descalços, sem sequer perguntar-me se as queria, nem se importou com as coisas as quais, atribuía algum tipo de valor importado.
Ditando novas regras de um jogo que eu não escolhi jogar.

(A vida é feita de escolhas)

Revendo delírios em tantos grilos, gritando dentro de nós.
Agora, respingam desabafos escondidos nas horas de silêncio.
E ainda resiste a miséria disseminada nas vozes das ruas, quando alguns velhos sem amparo (ainda), zelam por possibilidades de esperança.
Milagrosamente, insiste na cegueira da fé, indispensável sobre as curvas do caminho.

Estranhamente, derramo algo novo, resquícios de um mundo caduco, consumindo de tantas verdades.
E recolho-me na essência camuflada sobre a pele, mais próxima de minha morada.

Texto: eliz pessoa

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Tantos fins, re-começos, traços de esperanças espaçados no caminho, delírios de noites rasas, alegria de festas, marasmo cotidiano, catarse dos dias, metade de mim, processo do resto, decomposição derradeira, apologia à palavra, afasia mira bolando sentidos. Princípio de tudo, rituais adversos. Dor nos ombros, costas largas, peito de remador. Homens e mulher no instante do beijo, língua insatisfeito percorrendo detalhes do outro rabiscados em nós.

Toques de celular, rascunhos em celulose, respiração ofegante, olhos que se deitam, dias claros trabalham aqui. Retrocessos onde re-invento um tempo novo.
Outra malícia, alegria estampada na cara, velha roupa colorida.
Brasília re-partida, lados que se opõem, esbarroes que se espreitam, Rio, delírios e afins.

Dígito de dedos rápidos, agonia de mente inquieta, ventila dor e o vento liberto lá fora. Fora isso, dês-complico apagando lembranças mortas.
Prima Vera, flores de plásticos, flores de fato, flores... Apenas elas.

Amores em vão, amores em si.
Mas os corações vagabundos, ainda vagam nas ruas da cidade e numa pausa o instante perde-se sem muitas palavras.

Ando tão a flor da pele que floreio pelos cantos.

:: eliz ::

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Bem depois de você...




















Desenho: Luiz Zerbini


Porque depois de você, estive em mim, mudei a cor dos cabelos, li outras poesias, enjoei de romances e fui tomando gosto pelas coisas apimentadas. Segui, desvencilhando os ouvidos daquela música que trazia um pouco das lembranças soterradas de você.
Nem chega a ser saudade, pois me recordo de cada detalhe escondido no seu rosto, sensação da barba espetando os contornos da boca. Pois dizem que quando é saudade, a imagem do rosto se apaga na lembrança e adormece no silêncio do peito.

Depois de você, desejei com ardor alguns atalhos que poupassem o caminho, quando a falta de descuido cuidou de mim. Dispensei muletas, porque sempre soube de minha força pra seguir. Pois embora algumas aflições sugassem a alma, minha alegria independia de sua presença, como algo que teima em ser, pleno em si, sem outros devaneios.
Comecei a escutar os muitos sons de cigarras agarradas em troncos secos das árvores plantadas nas quadras, depois tive a sensação de aperto inovada no peito, como anúncio de final de ano, mais pra lá do que pra cá.

Sem você, algo passou junto e muito ficou guardado dentro de mim.
Outras perguntas martelaram na minha cabeça oca, formando filas e filas de exclamações, aclamando respostas por algo novo já caducando, como a fragilidade da pele sobre o tempo da gravidade.

Porque depois, bem depois de você, percebi que não cabia mais querer você. Pois você não existia mais na infinitude dos meus dias. Preferiu assombrar meus momentos de solidão.

Também tomei gosto pela coisa, aprendi a sair sozinha, esqueci alguns caminhos, descobri outras verdades, desejei outro contorno, apelos nos pêlos em mim.

Porque depois de você, não havia mais você, restando a mim.

Depois, bem depois de você.

: : eliz : :

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Escrito no saco de pão




















Desenho: Luiz Zerbini

O porteiro, desnuda a revista de palavras cruzadas ao final de expediente, repartindo ao meio o transcorrer da semana, enquanto na entrada do supermercado o cachorro espera ansioso o retorno de seu dono. Amarrado aos laços da coleira, seus olhos assistem o movimento que passa. Língua pra fora, cheiro de pão de fim de tarde, enquanto as letras dão formas ao saco de pão. Seis unidades ao todo, cinqüenta por cento pra cada.

Do outro lado, dois homens. Um caminha, outro corre. Em sentidos opostos seus destinos cruzam-se e passam. Todos os dias são quase assim...

O respeito sobre a faixa de pedestres desvia a atenção, quando ela passa... Corpo pesado, sacolas de compras na mão esquerda, inclinando o corpo para a direita das coisas.
Alguém grita por Marina. Ela aparece na janela e joga a carteira para que ele compre outro pão, quando a chegada da noite lança trégua sobre o dia quente. Mas alguém sentado de costas tem formas conhecidas – descuidos de bares à toa.

A parada de ônibus, agora cheia, em nada se assemelha àquela da noite de ontem.
Depois das putas, prateleiras amontoadas de livros, enfeitam o programa das moças de “cultura”. Dá até pra ler enquanto o cliente não vem.

Amortecendo a mola do parafuso, afrouxo a braguilha de um pensamento. Atitudes de raios que o partam.

Há tanta ironia no caminho, nas voltas e voltas do mundo que passa, quando se passa com ele. “Metamorfose ambulante”, percalços descalços dos meninos pés-sujos.
Fim de tarde, cigarras arriscam cantos novos e anunciam ares de ida.
No meio do silêncio, o barulho caminha no escorregar dos carros.

Mas não há nada comparável ao cheiro do pão quentinho, depois de um dia cheio de idéias.


:: eliz ::

terça-feira, 18 de setembro de 2007

"Mulher de Trinta"

foto: internet



O fato é que a Paulinha sugeriu um texto aos trinta. Pensei, repensei, matutei como seria feito, quais idéias levantariam e compliquei-me nesses devaneios tolos, amortecendo o desenvolver das palavras.
Depois, freei os pensamentos, esvaziei o caminho e deixei que as circunstâncias provocassem o desejo nelas.

Nos últimos dias fiz reflexo na “juba”, achei pouco, fiz retoques, exagerei na cor, iluminei o rosto, dando ares de loira, enfeitando os fios dos cabelos. Até gostei, me percebendo outra mulher, como se eu pudesse mudar de cara num dia, uma espécie de troca de roupa. Aí, os dias foram dissipando, provocando ares de desconfiança com a imagem refletida no espelho. Tentei até me convencer que estava bom, mas bastou uma pincelada pela noite, para um fotografo desses sites da cidade, registrar a imagem de uma outra Eliz, meio diferente da que vive comigo todos os dias, para eu renegar as novas madeixas de moça de trinta. Virei morena de novo, olhei no espelho e abracei a idéia caduca em mim. Enquanto isso, uma amiga levanta a tese de que já faz parte da suposta “crise” dos trinta minhas mudanças mundanas no decorrer da semana. Olhei torto para a idéia, depois fui assimilando-a. Seria mesmo devaneio dos trinta?

Então, veio a festa, outra ousadia, segui sozinha, sem companhia programadas. Desfiz-me refeita em mim, dancei de uma pista a outra, descansei os olhos ao som da música que embalara e concentrei-me nos ruídos da música e segui misturando bebidas sem me dar conta das conseqüências do depois. Reencontrando pessoas, celebrando a festa, fui me envolvendo com torpores.

Mais tarde, já era tarde e o primeiro porre consumou-se em mim, quando o mundo rodou, as pernas não se firmaram como antes e a imagem refletida sobre os olhos pareciam míopes e estrábicas.

Voltei pra pista e pedi socorro: “pare o mundo que eu quero descer!”
Ela acolheu-me, me tirou da multidão, sugeriu botar pra fora e vomitar. Constrangida, fui libertando-me dos conceitos de educação e larguei as aflições contidas no excesso de álcool. Adormeci no carro quando a aurora anunciava um novo dia, o reboliço da cachaça já não era latente aqui. Restando gentilezas nas frestas da noite. O primeiro grande porre aos trinta. Uma nova cor nos cabelos aos trinta e outras vertentes aos trinta.

Dedico este à Paulinha pela idéia germinada e a Belzinha e Dariu pela gentileza, e a todas as mulheres de trinta miúdos, amiúde, mudos aqui.

: : eliz : :

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Teima arrogante interrogando o saber...

foto: internet

Queria calar essa teima insistindo em minha lembrança, como “murro em ponta de faca”.

Mania de tomar meus minutos de silêncio. Porque não quero parar no tempo, nem ao menos pará-lo em mim. Quero a mente cheia de ocupações, textos, projetos, frases e afins perdidos nos seios dos livros. Quero calar os mesmos gritos, esquecer algumas lembranças que insistem em derreter no calor dos dias. Devorar João Ubaldo, bordas e borrões de poesias, papéis amassados no raso da mesa. Estudos que sugam horas livres e usufruir outras metades de mim.
No meio de tudo, escrevo cartas e as envio para outros olhos, esquecidos a distância.

Ando dispensando hiatos, desejando ditongos, arriscando dígrafos, desarmando ironias e devorando metáforas, para, quem sabe assim, reencontrar rascunhos novinhos em folha.

Porque, como numa partida de futebol, o risco pode transformar-se num grito de gol.
Pois, por ora, sinto-me o camisa um da seleção, defendendo barreiras. Mas não há nada que se iguale a um zagueiro em transe, percorrendo os caminhos do gol.

Por enquanto, arredondo as formas da caligrafia, respiro buscando compassos que reencontro no abraço, que encosta ao coração.
Com pulso firme, divido o instante no momento em que passa, aumento o som da tv pra não ouvir mais nada.

De formas firmes, exercito passos de bailarina, mas basta perceber um vacilo da noite, para esquecer a coreografia e insinuar outros olhares. E o mundo se abre quando os olhos se deitam.

Há tanta magia no momento que a mente se recusa a esquecer, ficando ali, vagueando por caminhos perdidos. E por que não, se as cigarras ainda cantam no começo da estação?

Ah, mas se essa teima pudesse calar, esqueceria o seu retrato nos caminhos da distração.

: : eliz : :
foto: internet

Silêncio,

enquanto as roupas secam no varal, a hora se mostra - tardias repetições exercidas nos dias. Mudanças nas cores dos fios de cabelo, labirinto dos trinta.

As cruas unhas dos dedos dos pés e mãos, denunciam descuidos - cutículas ressecadas na secura do clima. Pensamentos que programam a semana, respostas aguardadas, enquanto ao longe, uma mulher geme de prazer com outro alguém. Calor “arretado” e luz acessa.

A coluna reclama dos maus tratos, e o barulho da água sobre a pia da copa alimenta sede no corpo. Um copo de limonada do limão colhido na rua, três livros de Saramago, alguns textos de João Ubaldo (gosto tanto desse jeito...), luzes que emergem, Glauber de sempre, evangelhos e cortiços. Um felino estressado reclama pela casa. Busco um “cadinho” de paciência, enquanto outras idéias folgam comigo na cama.

Um prato de macarrão, cartas amontoadas no isopor da parede, letras cansadas, retratos de um país desprivilegiado e sincero na crua verdade, cheiro do alho queimado, alimentando sentidos. Canto a si mesmo e cegos que se multiplicam no livro. Olhar vagabundo, preguiça domingueira. Gentileza-palavra completa. Cabelo disforme, crescendo e escondendo os mistérios da nuca calorenta. Arte de conviver. Fotos da última viagem: clássicos no maracá, pôr-do-sol nas pedras do Arpoador, sombras em Vidigal, pose com Drummond, abraços nos braços do redentor, All Star guardados na areia, ondas que se turvam, flores para Yemanjá e Oxossi no meu coração. Outros blogs, novas parcerias, idéia nova.

Do começo ao fim, Rê Bordosa. Depois quietude, celular desligado, tv muda e música calada. “Amanhã não tem feira”, mas tem construção. “Não tem mais brincadeira, não tem mais confusão.”

No meio de tudo, amanhã ainda é o maior mistério.

:: eliz ::

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Contratempo de um velho coração

foto: smuff


Despretensiosamente, acessei a Internet em espaço público, aberto a outros olhares. Vasculhando meus e-mails, fiquei ali exercitando minha miopia cansada, com os olhos sobre a tela do vídeo.

Ele chegou, sentou-se na máquina ao lado, ajeitou os óculos sobre os ossos do nariz, pegou no mouse com certa falta de jeito e acertou a mira no monitor. Desliguei-me do fato ao lado. Depois, ele veio meio sem jeito, pedindo para auxiliá-lo no acesso à página virtual. Segurava em suas mãos um guardanapo de restaurante com um endereço de e-mail, mais nada. Ele referia-se ao endereço como se fosse um sítio. Levantei do micro que eu usava e fui explicar as diferenças entre sítio e e-mail. Ouviu-me pacientemente, depois disse que não tinha um e-mail. Sugeri que fizéssemos uma conta, para que assim ele pudesse enviar a referida mensagem para a tal pessoa. Topou na hora. Mecanicamente, fomos descobrindo os caminhos da rede, buscamos o Yahoo e criamos uma conta.

Depois de feito todo o processo, deixei-o livre para escrever à vontade.

Ele, com aquele dedo indicador procurando o P no teclado, indicado pelas letrinhas, digitando no seu tempo, ao seu modo. Tratava-se de uma confidência de amor, pelo que pude perceber, não quis invadir sua privacidade.

Ele, um senhor aparentando uns 57 anos, pele cansada, olhos pesados, simpatia e um pedido de ajuda. Geminiano como eu, como pude perceber pela data da nascimento na hora de preencher os formulários eletrônicos da conta, que ele quis omitir.

Mas o que aconteceu é que o e-mail voltou. E ele, achando que tinha tudo dado certo, ficou ali, feliz da vida, acreditando que sua mensagem teria sido entregue ao destinatário. Mostrei que não havia ocorrido nada disso, pois a mensagem havia retornado com aviso de erro em inglês. Só me recordo-me do “sorry” e daquelas coisinhas que mostram quando a coisa não vingou. Coisas da tecnologia.

Ele perguntou-me se a pessoa responderia logo que recebesse. Respondi, com bastante honestidade, que dependeria primeiro, dela receber o e-mail. Segundo, da vontade dela em responder com a mesma urgência dele. Coisa que independeria da vontade dele. Então, enviou novamente o e-mail que retornou com a mesma velocidade de não recebimento.

Meio sem jeito, frustrado em suas expectativas, ansioso por um retorno vindo de lá. Tentou disfarçar sua falta de jeito. Novamente deixei-o pensar sozinho e retomei minhas atividades virtuais.

Pensou, repensou e resolveu fechar a página na Internet sem fechar sua caixa de e-mail corretamente. Tentando ajudá-lo de alguma maneira razoável, perguntei se ele havia fechado direito seu e-mail, retomei a explicação abrindo a caixa e voltei a tocar no assunto do e-mail... Como quem tenta vingar-se, talvez do próprio sentimento, ele disse que tinha apagado tudo. Que não queria mandar mais nada. Estranhei, mas reconheci de imediato a atitude derradeira, tão humana que cabe tão dentro de cada um de nós, em algum canto de nossa passagem, varada pela existência. Tentando prender a atenção do meu “aluno”, falei dos procedimentos ao desconectar o e-mail. Mais uma vez, ouviu-me, prestou atenção e disfarçou sem êxito sua tristeza.
Depois agradeceu pela paciência (que não tenho normalmente) e pediu meu número de telefone. Virou o outro lado do mesmo guardanapo onde estava o e-mail da moça, como se virasse uma página, anotou meu número lá e partiu.

Fiquei pensando em todas as nossas carências, querências, expectativas em relação aos outros, percebi que ninguém é auto-suficiente. Nem ele, nem eu, nem ninguém.


:: eliz ::

domingo, 9 de setembro de 2007

foto: vivis



Madrugada de sábado, outros quesitos.
Conversas jorradas fora, silêncio no escuro da noite.
Línguas cansadas, copos vazios, viagens agudas no raso do ser.
Metáforas, dramas e textos.

Livros benditos no vazio da casa.
Noite de sono, capacitando sonhos.
Lembranças faladas.
Amizades recortadas.
Amores que viram saudades.
Esfregões na nuca guardada.
Dedos que dançam sobre as letras do teclado.
Vigília de olhos cansados...

Noite a dentro, madrugada.
Duas horas da matina, manhã acordada.

Eu quero um amor novinho em folha.
E talvez me contente com uma folha novinha de amor.
Palavra que não cansa, casada com as bordas do papel.
Pautas de decisões indecisas.
Imensidão.

Eu me rendo no próximo parágrafo.
Centavos de mim.
Reciclagens de comportamento.
Revisões de pensamentos.
Renovação redobrada.
Pensamento na rima.

Ruídos de ruptura, descompasso de bailarina.
Quero um livro e dedicatória, e muitas idéias espalhadas por aí.

: : eliz : :

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

foto: eliz pessoa


De repente a vida foi tomada de arte.
As ruas, viagens, amizades, contornos da cidade.

Quando acordei, ela já havia se espalhado, empregando tudo.
Tomou meus últimos goles de cerveja, assaltou esquinas, pintou-se nos muros erguidos nas ruas e paradas de ônibus. Nada. Absolutamente nada, foi roubado.

E os olhos, tão acostumados com o dia-a-dia, cegaram de tanto de vê-la.
Então o que antes era pobreza, vestiu-se carnavalisando o retrato, congelado na fotografia.

Os desconcertos, atropelos da vida, viraram textos, a solidão acompanhou-se de tantas sensações, que deixou de ser sozinha.
Completou-se nas querências de tanta harmonia estampada lá fora.

Novas melodias ao meio dia espalharam-se nos ares das praças.
E outros autores, poetas, escritores e loucos, deram graça a novos contextos.
Outras idéias...
E a vida passou a ter sentido, sentindo-se nela.

No nó do mundo e no bater de corações, a arte de um Deus quase humano.

Agora, já vestimos a cena e somos atores convocados por ela.
E até o centro das grandes cidades, prolifera arte e em cada um de nós.

: : eliz : :

terça-feira, 4 de setembro de 2007

foto: eliz pessoa

Queria um texto sacana, cheio de malícia, pornográfico.
Um texto como a essência de Nelson, um texto depravado na língua.
Que jorrasse dentro do corpo indecências infindas...
Um corpo esfregado no outro,
Pele por pele,
Pêlo no pêlo.

Queria um texto sem vergonha. Escancarado, cru.
Um texto como o Rio, cheio de curvas e sensualidade.
Despudorado como o carnaval.
Sem vergonha como a vida.

Nu em minhas vontades, agora saciadas nos atos das mãos que, hora escrevem, hora praticam ações penetrantes. Desbravando entranhas, molhando essência, incasável desejo de algo perdido na carne e enfeitado na imaginação.

Língua nos seios, nas curvas que escondem segredos e segregam todo o resto.

Hoje, queria falar no útero de um ouvido alheio e assustar com palavras, experimentadas nas pontas de dedos. Sentir em cada detalhe, em cada suor alheio.

Hoje, queria um texto que superasse minha limitação, que fosse de sangue e carne, que não explicasse nada, contasse nada, que não fosse nada, além do sexo, por ele mesmo.

Queria um texto, sem poesia, cheio de orgia.
Sem cores, em preto e branco.

Um texto, uma entidade que dissesse por mim, o que não consigo dizer em palavras.
Como um gozo que invade almas, encarnado nas vísceras, entranhadas no ser.

Queria um texto de verdade, sem ilustrações e artifícios de beleza.
Mas que fosse a beleza em si, sem nada daqui.

Um texto que não exprimisse minha experiência, que contasse outra mulher, provocante e crua. Mais desinibida longe minha prisão.

Um texto além dos rabiscos, um texto que gemesse, que gritasse, provocando vontades em todos que lêem, que despertasse e ejaculações na alma, e se perdesse no próximo encontro.

Um texto pra fora.
De dentro de cada um de nós.

Hoje, queria um texto cheio de vontades perturbadoras. . .

: : eliz : :
foto: eliz pessoa



O “maltrapilho” descansa na grama amassada, enquanto a avenida W3, passa no descompasso dos carros que circulam em finais de semana.

Um ciclista sem camisa movimenta o pedal de uma outra magrela e as meninas na rua demonstram passos lentos sobre a margem da parada, que me outras cidades é ponto de ônibus. Por aqui, ponto de desnudas putas, de pernas descompassadas nos olhos afoitos dos meninos sem rumo. Sol escaldando a juventude dos ombros, porque as velhas caixas amarelas dos Correios ainda aguardam paciente, mensagem de um tempo alheio.

Enquanto o menino mineiro de Itabira do Mato de Dentro, envelhece cansado de guerra, na margem da praia de copas infindas, levando palavras para outra banda do mundo de lá.

Calorosamente as axilas transpiram sensações evasivas, quando levemente as leis da gravidade, cobram no esforço físico e mais disposição nas calçadas.

“Hoje é domingo, pé de cachimbo”.

Outro asfalto saliente colide com passos alheios. “Cores, raça, castas, crenças. Riquezas são diferentes”. E as crianças não dão a mínima importância a tudo isso. Preferem escalar troncos de árvores, ou arriscam chutes nas páginas do texto.

Duplicidade de formas, cabelo de doido, retrato estampado na parede da casa.

Reticências, indecências, paradeiro de tudo que passa. Ainda assim. “É proibido animais no jardim”, e as copas de árvores abertas, ainda transmitem idéias de proteção, protelando todo o resto.

Um casal, voltando das compras conversam harmoniosamente sobre o dia, mas os mendigos, bêbados, tortos e loucos, arriscam batucados no pandeiro, dando vida ao contexto das coisas: “o ladrão foi lá em casa, quase morreu do coração”.
Melodia despudorada...

Outro ato, e o silêncio. Asas de ruas desertas.

Um texto novo sobre um mundo caduco, ou, um mundo caduco sobre um texto novo?

Sentença de pensamentos furtivos...

Ainda é a secura desse ar e o cheiro das matas queimadas que incomoda. E o que enfeita, é a bicicleta de um sujeito sem nome, equipado com o rádio, entupida de sacos de latinhas de cervejas, trabalhando pela sobrevivência, sobre um sol malvado do meio do dia.



: : eliz : :

sábado, 1 de setembro de 2007

foto: eliz pessoa

A folha de jornal veio voando, voado, fazendo malabarismo no ar rarefeito da cidade.
E não havia sequer expectativa de vento.
Tudo ali, mágico como o sol dos últimos dias.

Sem labirintos de palavras o calor invadia a superfície da pele seca, enquanto algumas nuvens davam ares de graça ao céu azul daquele dia.

Algumas braçadas alongavam ombros de atletas e a água gelada brigava com as moléculas aquecidas dos homens.

Palma da mão, abismo do queixo e joelho ardiam, descamados ferimentos da hora perdida.
Por descuido de um pneu careca, ela fora ao chão e por sorte, ou obra do destino (quem sabe um anjo da guarda eficiente) machucarasse pouco.

Um triz a salvara de um acidente malicioso.
Alguns freios que a natureza permite, tão necessários às regras que dão continuidade a vida.
As coisas a paralisava de outros descuidos na cidade de horizontes vastos.

Sem que se perceba o reflexo ligeiro fora tão, ou mais eficiente que o cérebro pensante.
Instinto de sobrevivência, dando partida a hora H - momento crucial na vida de alguém.
Por fim, o sentido foi dando forma às voltas de sua roda rolante.
E tudo, por meros segundos, seguravam ações duradouras.

“Brasiliensemente” ela reagira, dando velocidade.
E passando o mundo surgira.


: : eliz : :

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

foto: eliz pessoa

No início é o impacto, o surto e o beliscão apertando a consciência da verdade.
É quando se chora compulsivamente e algo parece fugir ao controle, como se quiséssemos parar o mundo e descer. Só que não descemos. Nosso instinto de superação sobrevive às migalhas do rompimento que não rompe conosco, pois seria, e é impossível caminhar sem nossa ação voluntária e muitas vezes (maioria delas) solitária, num vazio que insistimos habitar em nós. Pura mentira! Somos tão preenchidos de tantas coisas, só nos esquecemos disso no ato de desespero natural, humanamente viável.

Depois vem o dia... E outros, e embora a lembrança martele na memória algumas imagens fadadas ao esquecimento, as posições, agora invertidas, não tecem mais os mesmos contornos. É preciso parar o “muro das lamentações” e proclamar um canto novo, iniciado de dentro para fora de nós.

Não há receitas de bolos para certos descompassos descoliografados pelo tempo, mais de passo em passo, caminhamos a cidade inteira. E gradativamente novas performances nos serão cobradas, pois o tempo não tarda em seus compromissos. Do contrário, nos cobra ruga por ruga de nossas noites mal dormidas, nosso excesso de exposição ao sol, de nossa negligência com o uso incorreto das palavras. E a pena, recai sobre nós.

É preciso sintonia para acompanhar as notícias do rádio. Para amadurecer as relações, tempo. Senão arranhamos fatos gravados em vinis, machucando a agulha sobre a superfície de músicas que resgatam lembranças tardias.

Em meio a tantos escritos, é preciso deixar morrer alguns deles. Não que eles não sejam importantes. Eles apenas foram importados made in passado. Assim mesmo, incrivelmente cru. Porque a vida é o momento e todos eles esvaem-se, do mesmo modo como nós jamais seremos os mesmos como os idos, lidos neles.

Mas com todas essas novas possibilidades, ganhamos a liberdade de depreendermos das mesmas vertentes. Renascidos, a vida embeleza-se e convida-nos à festa, exigindo novas roupagens, jogando fora mortalhas, amordaçando a língua minguada para os assuntos que perderam o prazo de validade.

Completamente, ficamos quase prontos para o novo espetáculo, onde só admite-se borboletas renovadamente coloridas. Deixando o casulo de lado, sobrevoamos nossas novas transições.

Equilibradamente, experimentamos desequilíbrios para tentar caminhar sobre a linha tênue entre a superação da dor, que não mais nos pertence, esvaiu-se em persistência na rotina dos dias, que, às vezes, parecem fadigados em si, mas resplandecem inteiros em nós.

“E agora José, quem disse que a festa acabou?”.

: : eliz : :

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

foto: internet

“Poeira, poeira lavadeira, enfeitadeira, poeiraPoeira vermelha...”

Eu não saberia contá-la, cantá-la, porque minhas palavras são tão rasas, perto de voz forte de uma morena árida e eternamente doce, uma flor do Cerrado, fruto de nossos conflitos tão bem relacionados em sua convivência.

Presença em forma de presente nos palcos da cidade, consegue resgatar na cidade de muitas províncias, nossa identidade - alma de artista.
O que é ser brasiliense.

Compositora de nossas verdades, de nossa Ceilândia e suas feiras nordestinas, tão a cara de uma Brasília escondida no entorno transbordando em nós.
Ela é daqui e por isso mesmo do mundo. Cosmopolita, poesia refletida pelas luzes do espetáculo de sua presença. De tantos outros cenários e espetáculos que ela pisará cantando sua arte, com a voz que impõe respeito até ao público mais desatento.

Cantora, compositora, percussionista, artista cênica, dona de idéia repleta de sua personalidade: “razão, consciência, senso, inteligência, uma cabeça pra pensar”. E ela pensa, e ecoa sua alma pelos cantos de Brasília.

Filha de N’ Razões, Damas de Ouro, melodia desgarrada, sorriso avassalador e simpatia contagiante. E ainda dizem que essas qualidades não são naturais por aqui.

Ela é o samba, funk, afoxé, música de preto de branco, de pardo.
Música miscigenada em sua garganta, em sua raça, que é minha, é nossa e não é de ninguém.

E se há algo engrandece um povo, é a arte quando reflete a alma do lugar.

Ellen Oléria, esse nome cantará história em nós.

: : eliz : :

terça-feira, 28 de agosto de 2007

foto: eliz pessoa

Não queria mesmo arriscar um texto novo, porque por vezes a novidade caminha repleta de atos falhos, desvalidos em sensações escorregadias. É quando as histórias escondem-se dos dias descontextualizado-os, como um escritor sem escritos.

Então, forço-me e não estraio nada, traindo-me estupidamente. Porque a vida não desnuda-se quando nos aprontamos para a festa. A vida vai além de tantas programações e pede passagem sem que liberássemos o caminho. E presente para quem presenteia-se das delícias propostas por ela.

Teimosamente, arrisco cifras que não valorizam a infinitude do momento e ainda a tanto o que jogar fora perambulando palavras. Ainda arde caducas sensações, quando muitas idéias hipnotizam-me, tapando o olho direito como piratas a realidade escondida na hora perdida.

Aí, escrevo e apago, depois modifico a posição das palavras e as leio, achando que não era bem isso o que eu queria dizer (e eu nem sei o que quero dizer a todo tempo) embora todos os motivos façam-me contar coisas... do fogo ardendo na mata, o libido de um sonho indescente e perturbador, a frase que alguém deixou cair e eu peguei prematuramente, os livros amontoados na estante da parada na quadra, as duas luas do mês de agosto, as posições de Marte e Vênus na casa cinco, conjugando atitudes belicosas e ousada no ato do nascimento da moça, contrastando a todo o restante latente aqui.

E tudo inquieta-me tanto, do ensandecido barulho, aos absurdos propostas pelo silêncio.

Talvez, de tudo fique um pouco. E pouco a pouco um texto encontra-se, perdendo palavras.

Mas sinceramente, às vezes me cansa tanto etinerário...


: : eliz : :

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

foto: eliz pessoa

Porque escrevo para tornar o mundo menos importante, mais próximo daqui.
Dos dias, das ruas, de tantos olhos sobre as mesmas coisas fantasiadas por nós.

E assim sigo galgando outras arbitrariedades, desmistificando alguns juízos.

Escrevo para ficar mais próxima de mim e para me negar no dia seguinte, como se nada daquilo mais fosse verdade, ou ao menos, houvesse existido em essência.

Talvez por não saber fazer outra coisa (ainda) escrevo, e teço-me num terço cheio de poesias e cansaços das melodias impregnadas por elas. Por isso me perco e rendo-me em cada palavra. Depois descanso a língua cansada de tantos contos e tantas metades desfeitas. E fico só, namorando palavras adormecidas em outras cidades, reescritas por outros punhos serrados em mim.

Pulsando como o relógio nos dias, arrisco rabiscos, e olho torto a grafia de minha personalidade desmascarada por elas. Porque nem sempre me aceito.
Depois acredito em outras possibilidades, novos rascunhos, cadernos de caligrafia, para arredondar e domar a letra, e tento enfeitiçar os olhos que deslizam sobre as formas disformes. Permito que elas se se encostem aos cadernos destinados a outros estudos, ignorados por mim.

Humanamente, amo as palavras e trago-as pra dentro, escrevendo livros amontoados em minha imaginação, vasculhada de tantos pertences alheios, poetas sentidos nos lidos de minha leitura.

E me deixo penetrar, eternizo noites de amor, cumplicidades esquecidas nos corpo alheio e revividas aqui, como saudades, saudando lembranças pintadas por letras coloridas.

Porque me desconheço sem elas, como o vício de substâncias entorpecidas, roubando e resgatando sensações infindas...
E dependo da manifestação delas em mim.
Quase uma entidade, em segrego espalhado na vastidão de devaneios e na arte de senti-las inteiras nos pedaços de mim.

: : eliz : :
foto: eliz pessoa

Inteiro, ele se mostra, cronicamente sentado sobre o banco da praça, próximo ao centro da cidade, onde passos “machadianos” de muitos Assis dão nome a importância ao maior entre eles, bem ali, no Largo do Machado. Letrados asfaltos, calçados por pés de gente comum de todos os gêneros, anônimos em muitos caminhos.

O tempo, alimentando pombos, perdido em si mesmo e fazendo-me encontra-lo na imagem registrada pela modernidade digital, maturando pensamentos que exercitam palavras aqui.

Paro um pouco afastada e registro ao longe a fotografia que diz tudo que experimento depois de provocada pelo senhor de brancos cabelos longos e olhar desconfiado com minha presença confusa. Arrisco-me novamente, deixando de lado toda minha caretice e aproximo-me do tempo, envelhecido nele.

Autorizada por seus olhos cansados e inibidos, pelo seu Português escondido na língua silenciosa. Mas ele aprova com um rabo de olho o registro da imagem que pariu o anseio de um novo texto.

Então, posiciono-me já com os pombos dispersos e a carta manuscrita em suas mãos de muitos aniversários, vêem dando mais sentindo a evolução da palavra.
Por outro lado, ele finge não se importar com minha presença, mas denuncia-se com um olhar de vista baixa no momento da foto.

Um click afasta-nos, ao mesmo tempo em que aproxima-nos o imortalizando na imagem congelada pela foto, e eternizada enquanto vida houver aqui.

O tempo contando verdades, decifrando mentiras, bordando imagens e despertando todo o sentimento latente das letras jorradas em folhas de papéis que não desnudam quem delas se empresta, mas conta o que o escritor arriscou dizer.


: : eliz : :

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

foto: eliz pessoa


Logo quando chego, já sinto os efeitos do clima nos poros das narinas.
Pele, cabelos reagem simultaneamente à aridez da secura.
180º Graus de um céu que parece engolir a gente...

Agora, tudo é plano, concreto, arquitetado pela idéia de homens.
Erguida, tijolo sobre tijolo, pela força de trabalho dos candangos, nordestinos, muitos deles mortos nas valas das obras da construção, de uma cidade mística e futurista, com prazo para fundação – fundição dos sentidos.

Cidade pré-matura, centro das decisões, e aos 47 anos, sua história continua sendo construída, como num quebra-cabeça, peça por peça.
Por aqui não há uma identidade, mas o encontro delas, língua em movimento, metamorfose ambulante. O que a torna mais interessante é essa fusão de culturas, a troca de experiências de todos essas querências, de todos esses Brasis.

Multifacetada, miscigenada, organizadamente confusa, “ilha da fantasia”, labirinto de sensações nas pessoas que aqui se esbarram e esvaecem como pescadores de ilusões, mar de gente.

Em meio a calmaria provinciana, centro das atenções atraídas para o núcleo do poder, tão repleto de insanidades. Como uma Nova York, cidade de muitas línguas, gírias e etnias. Aqui o Brasil se encontra e confronta-se nas diferenças, enriquecendo as relações.

Os filhos paridos por ela, são brasilienses e geralmente trazem em suas veias, sangue nordestino, criações mineiras e corações carioca.

Além de tantas possibilidades, indígena, negra, confusas por tantas erupções camufladas por nós. Misturada por nossos desejos de nos encontrarmos no corpo do outro, de outra cidade, de outras vertentes, de outros abismos que cabem tão bem em nós.

Brasília, mãe de muitas verdades.


: : eliz : :

domingo, 19 de agosto de 2007

foto: eliz pessoa
Enquanto os caras ao lado, fumam seus baseados, exalando a essência nos ares do sol, que preparasse para poer no Arpoador, alguns namorados apertam-se em abraços sensuais, provocando fragmentos de alguma sensação furtiva. E lá embaixo, as ondas do outono, entregam-se sobre as pedras, provocando barulho no Atlântico. Os meninos do Rio olham curiosos os atos da escrita, e nem sequer percebem que já fazem parte do desenvolver das palavras contidas nela.

Uma nova tragada, traria lembranças entorpecidas, mas ainda prefiro desconhecer o caminho.

Uma linda garota do mar empresta suas formas as curvas das ondas cristalinas. Mergulha sua prancha, furando-as.
Como pássaros, nos esprememos em busca de um lugar na pedra, para receber os últimos raios de sol de domingo no Rio. Reboliço de idéias...

“Pra caralho alguém diz ter melhorado”.
Tomara...

Alguns rituais vêm dando ênfase ao texto jogado ao mar. Quando a caneta colori de tinta, linhas seguras.

O que antes era bonito, agora não passa de ridículo e sorrir de tudo isso, não é bem um remédio, mas desmistifica o caminho anteriormente percorrido.

Talvez tanta poesia, canse mesmo...

Malandragem, palavra preterida para ativar outros pertences. E eu não pertenço a tantos “nadas”.

Como surfistas que espreitam sua hora sobre as ondas, eu também aguardo a minha. Outras ondas e marés. Mares de mim.

Os raios de sol já não miram o Vidigal. Lá, a sombra já faz morada.
Rarefeito, raridade, rara essência.
Raramente estamos assim.

: : eliz : :

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Dentro de mim, há um abismo repleto de múltiplas palavras.
Há também intervalos de tempo, descompassos de solidão.
Maremotos, redemoinhos, Paineiras... Emoção.

Dentro de mim, há uma estrada e vários caminhos.
Algumas sentenças... Recomeço e vastidão.

Dentro de mim moram lembranças, cartas escritas, textos repartidos. Inundação.
Ações destemidas, movimentos fluidos, escorregadia sensação.

Dentro de mim há um poeta, um amor... e outro, outro, mais um passo coreografado pelo tempo. Um segundo de libertação.

Dentro de mim, brotam festas...

Dentro de mim, muitas coisas acontecem e perdem-se com a vida, com os prazos, com as regras, com a lida.

Dentro, bem dentro de mim, há um ser que desconheço, que ignoro, que não dou essência a existência dele.

Dentro e fora de mim sobram túneis, cidades esquecidas, frases tardias, sentimentos molhados.

Dentro, dentro, dentro... Às vezes, não há mais nada.
Apenas o silêncio de uma foto esquecida no banco de uma pequena praça.


: : eliz : :

FLA X FLU

Foto: eliz pessoa


Até mudei a cor da caneta (antes vermelha) para dar sorte no jogo.
Por ironia, estou no bairro do Flamengo. Mero detalhe...

Visto minha camiseta black power em verde e amarelo, solto a cabeleira pra fazer jus ao as palavras exibidas nela. Dirijo-me a Praia do Flamengo e no caminho deparo-me com alguns flamenguistas pingados. Aproveito o processo e os sigo. A condução que eles pegarem será a minha.

Redigindo alguns detalhes... Noite de clássico no Maracanã.
FLA X FLU e lá vou eu.

Escrevo para afastar pensamentos, enquanto o trânsito não ajuda o desenvolver das palavras. Pela primeira vez, impaciento-me com algo no Rio.

Lá fora, alguns torcedores saltam dos carros e seguem a pé.
Salto no “maracá” do lado dos portões da torcida do Flamengo. Confusão generalizada, e eu correndo da massa rubro-negro. Indo assistir ao jogo do lado do tricolor carioca.
Correria e mais correria pra chegar em tempo de pegar o início do jogo.

O cartão comprado em mãos de cambistas amedronta-me, quando arrisca falhar na hora do vamos ver. Frio na barriga... Mas não falha.

Maracanã, cá estou.
Palavrões infindos e até eu quero gritar: “Sou tricolor! Ô! Ô! Ô!”. Eis o poder das massas.
Se há uma palavra que expresse tão bem uma noite de clássico, é festa.
Do lado tricolor, os palavrões brotam da saliva de muitas línguas, sem muito cuidado. E quanto mais pesados, mais alimentam o clima de rivalidade entre as torcidas.
E lá vem a bandeira gigantesca do Flu. Passa de mão em mão dando cores a carnavália do momento.

No telão, jogadores são anunciados, colocando à par os mais desinformados. Quando Roger é vaiado. Também pudera, quem manda vestir a camisa e sair beijando outra? E se faz com o último, fará com os outros. Como se tudo, de repente, fosse mesmo uma questão de cifrões cheios de bolinhas arredondas à direita dos números.

Começa o clássico. Alguns se benzem, fazendo o sinal de cruz e beijando a camisa, pais e filhos compartilham a mesma emoção, quase hereditária, em alguns casos. Xingam, torcem e vibram. É um tal de: “senta veado!!!” E um instante, para ver o jogo.

Aqui, qualquer cabeçada, empurrada provoca reações alérgicas na galera. E os “veados” continuam todos de pé, tampando a visão do fanático torcedor que pede: “Chega junto porra!”. Quando o jogo muda de fases com certa constância, como hormônios nos corpos femininos. Já me sinto parte da festa, desesperando-me e divertindo-me com os tricolores cariocas.

O fato é que a torcidas faz mesmo de tudo para estimular seu time e desenvolver a “parada”.
Dedadas, filhos das putas multiplicadas e muitas “porras” ejaculadas pelas línguas proféticas do público. E qualquer chute aproximado do gol é motivo, ou de tensão, ou de intuições despudoras. Eu quero ver gol!

Roger pega pesado no lance, provocando a fúria fluminense, que grita: “Roger, filha da puta! O Fluminense não precisa de você!!!
Renato Gaúcho, ex-técnico do Vasco da Gama (meu time de coração) fica ali, em pé, visivelmente apreensivo, quanto seu arc rival, dono de uma língua desastrosa, assiste no bando de sua inquisição.

Agora é a vez dos hormônios masculinos manifestarem-se nas palavras, gestos dos machos torcedores. Ficando nítido que os jogadores, jogam com a emoção das pessoas. Bombeiam corações de milhões, muitas vezes sem preparo, e é aí que carecas puxam cabelos inexistentes, gargantas ressecadas esgoelam-se sem serem ouvidas, palavras viram crônicas e paixões ficam mudas. E qualquer desleixo de uma bola atrasada, ou esquecida é motivo de desespero, mas nunca desesperança.

E lá vem a maca para um jogador-ator, ou atleta contundido.

E de repente ele ergue-se, dribla e deixa pra traz seus adversários e segue, praticamente sozinha ao rumo do gol... E é, GOOOOLLL do Flamengo!!! Às 21h17, treme as arquibancadas e é festa do outro lado do estádio.

Desconfiem sempre que um zagueiro toma fôlego, avançando sozinho na grande área. Fatalmente é gol. E para quem permite o acontecimento, é sinal de esquema tático defasado. Vacilo mesmo, no bom e grosseiro Português. E nunca vêem junto de um gol, apenas um ponto, mas outras vibrações, a estima elevasse, a moral fortalece, enquanto no sentido contrário à impaciência adversária pede passagem, passando.

Final do primeiro tempo: 1 X 0 para o Flamengo.
...
Esfomeada pela idéia do empate é o estado do tricolor no início de segundo tempo.
O álcool já enfeita a escrita, o “maracá” efervescendo e o “merda” do Soares que “fode” qualquer possibilidade de uma boa jogada... “Fudeu!”

Emoção escancarada, bandeiras hasteadas e é guerra dentro da cada um de nós.

59.281 presentes. 49.828 pagantes e 759.126 cifras ($) somam os números da noite.

Como o jogo não muda no desenrolar das palavras, e restando alguns poucos minutos para o findar do jogo, alguns torcedores tricolor, já se dispersam.

Pro Fluminense falta finalização nas jogadas. Para o Flamengo, falta jogo, porém há finalizações. Eis o que determina o placar de um clássico.

Restando pouco menos de três minutos para o término do jogo, a torcida, torce, empurra, faz das tripas coração... E haja fôlego para tanta emoção derradeira.

Nessas horas, a vascaína que habita aqui, alivia-se por não estar na pele dos tricolores carioca, enquanto os Aiatolás Flamenguistas, esgoelam as cordas vocais, a imprensa invade o gramado para roubar comentários fajutos de jogadores, que nem sempre jogam o que devem, mas falam atrocidades vazias.

1 X 0
FLA X FLU
Clássico Carioca

Maracanã, um sonho plausível...

p.s.: aos queridos tricolores marcos e marcos jr. cariocas da gema, conhecidos na arquibancada do estádio. Valeu a companhia e a conversa jogada fora, nos bares do Largo do Machado.


: : eliz : :