quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Escrito no saco de pão




















Desenho: Luiz Zerbini

O porteiro, desnuda a revista de palavras cruzadas ao final de expediente, repartindo ao meio o transcorrer da semana, enquanto na entrada do supermercado o cachorro espera ansioso o retorno de seu dono. Amarrado aos laços da coleira, seus olhos assistem o movimento que passa. Língua pra fora, cheiro de pão de fim de tarde, enquanto as letras dão formas ao saco de pão. Seis unidades ao todo, cinqüenta por cento pra cada.

Do outro lado, dois homens. Um caminha, outro corre. Em sentidos opostos seus destinos cruzam-se e passam. Todos os dias são quase assim...

O respeito sobre a faixa de pedestres desvia a atenção, quando ela passa... Corpo pesado, sacolas de compras na mão esquerda, inclinando o corpo para a direita das coisas.
Alguém grita por Marina. Ela aparece na janela e joga a carteira para que ele compre outro pão, quando a chegada da noite lança trégua sobre o dia quente. Mas alguém sentado de costas tem formas conhecidas – descuidos de bares à toa.

A parada de ônibus, agora cheia, em nada se assemelha àquela da noite de ontem.
Depois das putas, prateleiras amontoadas de livros, enfeitam o programa das moças de “cultura”. Dá até pra ler enquanto o cliente não vem.

Amortecendo a mola do parafuso, afrouxo a braguilha de um pensamento. Atitudes de raios que o partam.

Há tanta ironia no caminho, nas voltas e voltas do mundo que passa, quando se passa com ele. “Metamorfose ambulante”, percalços descalços dos meninos pés-sujos.
Fim de tarde, cigarras arriscam cantos novos e anunciam ares de ida.
No meio do silêncio, o barulho caminha no escorregar dos carros.

Mas não há nada comparável ao cheiro do pão quentinho, depois de um dia cheio de idéias.


:: eliz ::

Nenhum comentário: