quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Para Quésede Garcia
Nem ao menos vou experimentar a dor desse momento de ausência.
Hoje escolhi me despedir de você com uma só palavra: ALEGRIA.
Porque nada mais casava tão bem com sua essência.
Por isso escolhi um lugar com sua cara, com as músicas que você, certamente, gostaria de ouvir. Depois abrir uma cerveja e fiquei ali experimentando as frestas daquela emoção.
Porque você não se foi, como dizem por aí. Pelo o contrário, ficou entranhada nas boas coisas da vida, desenhada no meu braço, felina na minha pele, irmã de minha escolha.
Por essas é que não consigo me despedir de você ardendo, e onde houver espírito de festa, alma da gente, alegria de amigo, ali você brilhará.
Muito prazer em conhecê-la, minha querida Quequé.
eliz
ps.: Para Quésede Garcia com toda a nossa ALEGRIA de sempre.
terça-feira, 4 de novembro de 2008
Copacabana
Sobre a ótica míope da janela, Copacabana se estende, enquanto o conforto dos hotéis à beira da orla enfatiza um pensamento.
A cidade está nublada e os apartamentos escondem suas casas sobre seus ápices e o mundo gira cotidianamente dando movimento a metamorfose de uma única palavra.
Daqui do trigésimo andar, as sensações são outras e esse nosso Deus de olhos distantes, assiste ao filme de cima, sem pretextos humanitários, e o mar de um dia cinzento, arrebenta ao longe numa praia, agora vazia. Amontoadas casas nascem nos morros e o excesso de altura estremece o equilíbrio das pernas.
Ingênuos nos tornaram, diante da grandiosidade das coisas, e elas, pequenas se tornam diante de nossa ingenuidade. Nesta cidade ainda acreditamos nas verdades, embora muitas vezes elas se camuflem nos corpos dos travestis, travestidos de sensualidade.
Por aqui, a vida prossegue na beleza do mar, na grandiosidade do ser, na capacidade de superar algo traído em nós.
Do alto de muitas idéias, o dia, implícito sobre Copacabana, intrínseco em cada um de nós.
eliz pessoa
segunda-feira, 3 de novembro de 2008
Sobre o Amor
Se o amor for essa coisa inatingível, utópica, inimaginável, longe do cotidiano, comum de dois gêneros, impraticável em todas as convivências?
Se passar muito longe de tantas vivências e de repente, revelar-se apenas num conceito, distante da lida e romantizasse tanto, ao ponto da inutilidade, na desfalecida exaltação de uma idéia de razões desconhecidas, e desfilar longe das essências, do ato na vida quando ela se pinta, resgatando apenas algum tipo de arte, recontada nos minutos que levam uma pouco da gente, na pressa derradeira dos tempos, no lançamento maluco das horas, entregues ao nada.
E se ele se esquecer de apresentar-se, e sem meias palavras partir, sem dizer que esteve todo o tempo ao lado da gente?
E se não deixar saudades rasas, mas lembrança sincera como parte de tudo que finda, haveria oportunidade de não deixá-lo partir de nós?
E se não houver perdão pra tanto esquecimento, e ele não passar do que eu sinto agora?
Ah, esse amor tão longe da gente, presente em tudo passa.
eliz pessoa
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
Entre tantos deles
foto: eliz pessoa
Pensou num cachorro pelo excesso de alegria do bicho, pelo rabo balançando denunciando os fatos e pela real possibilidade de dividir os passeios fora de casa. Um amigo para todas as horas. Mas a geografia delimitava o caminho entre os quatro cantos da casa fazendo-a desistir.
Depois veio à cabeça a idéia de um furão, uma espécie de gambá importado dos States, com um chip embutido na pele. Um animal típico de tempos modernos e igualmente estranho. O furo do bicho veio no preço e na distância latente entre os dois. Abortou a opção de número dois.
Uma gata, um tanto desencantada, se insinuou aos olhos dela, fazendo charme, pedindo carinho, colo e atenção. Não poderia ser dispensada. Deixou-se envolver e quando não mais percebia, lá estava a felina, demarcando os roteiros da sala, quarto, cozinha e onde fosse possível. Lentamente seus pêlos e apelos já faziam parte da casa. Bendita era a irracionalidade da peluda gatinha.
Em meio ao decorrer dos dias, uma espécie de intimidade entre elas fora surgindo, dando forma ao sentimento de ambas, resgatando algumas lacunas quase esquecidas.
A “menina gata” de um instante para outro começou a perceber mudanças no comportamento de sua querida. A gata começara a agitar-se, esfregando-se no chão, tremendo o rabo, abaixando-o. Desprevenida, a menina-moça, que a acolhera com toda a solidão do momento, não entendia o que se passara com a felina. Tentou de tudo: termômetro debaixo do braço, bolsa d’água quente sobre os pêlos que encobriam a barriga da gata, reza, procurou por sangue e nada, nenhuma suspeita ou rastro de algum descuido com a criatura, nem melhora diante das ações.
Decidida, acordou cedo, pois precisava arrumar um médico veterinário para tentar compreender o que acontecia com a gata. Pegou-a nos braços e levou-a ao primeiro especialista de animais.
Pra lá de preocupada, contou ao veterinário todas as tentativas para melhorar o mal na gata malhada. Depois de narrar delicadamente cada ação realizada e com os olhos de quem clama por alguma justificativa plausível, silenciou.
Ele, terminado de ouvir o relato da gata-moça, não se conteve e começou uma gargalhada irresistível, depois respirou fundo e disse a ela que o “problema” da bichana era algo que também atormentava as mulheres, pelo menos uma vez ao mês. O nome daquilo era cio, sangria desatada, ciclos femininos e afins. Que ela não precisaria mais se preocupar com os sintomas, pois agora já conhecia seus sinônimos.
Aliviada, sorriu, um tanto sem graça diante de sua própria ignorância sobre a espécie que ela escolheu para criar. Comprou uma pílula contraceptiva para inibir tanta loucura num ser tão pequeno. E deu graças a Deus por não ser assim seus ciclos férteis. Pelo menos não era assim que ela os enxergava.
Passados dias, a menina resolveu suspender os métodos tratados com pílulas na felina e resolveu dar mais vida aos dias da gata. Conseguiu um casamento arranjado com um gato Persa, cinza, robusto e fino, para viver a loucuras hormonais com sua fêmea.
Foi um maior estardalhaço o encontro dos dois. Quebraram espelhos, estranharam-se, repeliram-se e se encaixaram. Ensandeceram como fazem dois animais em prol deles mesmos.
Mas depois que a felina voltou para casa, já não era mais a mesma, uma espécie de mudança em seus hábitos e principalmente em seu comportamento refletiam-se em seu olhar e pêlos.
Meses após, ela dará a luz a um macho peludo e absolutamente querido por todos da casa. Ele foi crescendo, ficando adolescente, dividindo o espaço e pedindo passagem e começou a flertar com a mãe. Quando não almejava o peito para mamar, desejava outros caminhos para brincar. E sem maiores confusões derradeiras, eles se multiplicaram e a casa tornara-se quintais de felinos, de nomes distintos, personalidade difusas, preferências, perfis, uma multiplicidade. E o que antes se chamava solidão, agora beirava o desespero.
No momento atual, tudo que ela desejava era um só minuto de vazio e silêncio nos cantos daquela casa.
eliz pessoa
terça-feira, 14 de outubro de 2008
São Luis do Maranhão
A 35.000 pés de altura, sobrevoando o Porto Nacional, desbravando sensações, amortecendo sentimentos, cuspindo palavras e alguns devaneios do medo. Escala em Imperatriz às 23h. Olhos pesados, pálpebras cansadas e um sono beirando os abismos do silêncio, não fossem os barulhos de alguns pensamentos misturados com resquícios de sonhos.
Unhas vermelhas colorindo a escrita e uma leve “birra” com o suco artificial camuflado de laranja, contrastando a lembrança da fruta experimentada lá atrás. As putas das memórias tristes do Gabriel e outros pertences.
Na poltrona do meio, cá estou. Um tanto quanto incomodada com o cheiro de “peido” que acredito sair do sujeito ao lado, à minha direita. Uma, duas, três liberadas de flatulências me dão uma sensação de fobia latente. Explicação que justifique a condenação do sujeito como autor dos “puns”? O incomodo do cara se mexendo como se tivesse formiga no acento.
À esquerda, um maranhense radicado no Rio das maravilhas, sobrevive deixando no nordeste saudades, família e muitas lembranças.
Uma revista é dedilhada, outro livro é desbravado, joguinhos de palavras cruzadas, movimentos incansáveis no banheiro, relógio inerte no pulso, charge de Bush, olhos agora ardendo.
Até então não havia passado pela minha cabeça a idéia de pisar em terras maranhenses. Pelo menos não por agora, mas como alguma coisa de novo surgiu no percurso, eis que me delicio em São Luis, capital do estado do Maranhão.
Por aqui algumas constatações me surpreenderam, e talvez por não alimentar nenhum tipo de expectativa quanto ao lugar, o que percebi foi uma cidade limpa, do aeroporto ao centro.
Em princípio, São Luis agradou-me muito, vendo suas ruas, conversando com seu povo, sentindo o cheiro dos seus rios e mares, experimentando o Brasil.
Fui para o Centro Histórico da cidade de ladeiras e como toda história tece - paralelepípedos, casas coloridas, antigas, carregadas de coisas a serem contadas e camufladas. Bordéis, contos de Ana Jansen, fantasmas e alguns receios do passado ainda vivem na memória da gente dali.
Nas entranhas do Maranhão, outra brasilidade. Pousada Portal do Amazonas, cravada nas profundezas do Centro Histórico, casarão de 1835, uma das casas do mito Ana Jansen, que leva o nome da principal lagoa da cidade. Quando aqui entrei tive medo de dormir sozinha, muito pela energia que ainda se experimenta no lugar, onde muito negros foram aprisionados e muita maldade cometida e, muito mais, pelo fruto de minha cabeça enlouquecida por seus próprios pensamentos alucinantes.
Quem nasce aqui é ludovicence, a cidade foi colonizada pelos franceses com um misto da coroa portuguesa e resquícios dos holandeses, mas após três anos de predominância francesa os portugueses expulsam os franceses e imperam sobre a cidade, nascida próxima aos ventos que sopram mais ao norte.
É a capital nordestina mais próxima do Pará, e o que se percebe é a grande influência das misturas de raças nas gentes deste lugar. Aqui a miscigenação é concreta e exibida nas peles e nos cabelos desse povo. Na Praça Gonçalves Dias dentro do centro tombado, a visita da 2ª Feira do Livro trouxe ilustres escritores e suas confidências, bem ali onde se avista o Rio Anil, a sete metros acima do nível do mar, misto de mar, rio e mangue – muito mangue, enfeitando a vista da gente sobre a ponte que leva o nome de um dos seus filhos políticos – José Sarney. Obras políticas em época de eleição. Cidade Digital no bairro Alemanha.
São Luis é fascinante e, como diria a canção “a ilha maravilha”, de um povo muito bom de prosa, de praias extensas, areia escura, vento constante, extremo da gente, de gatos soltos por todos os lados, de histórias e marcos, de muita coisa para se contar e, acima de tudo, para se aprender.
E toda a vez que a vida me proporciona a oportunidade de conhecer lugares neste país, fica nítida a idéia de que o nosso Brasil é exuberante! Mas que talvez não saibamos tomar conta de tudo isso.
São Luis, um brinde à sua aos seus apelos!
eliz pessoa
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
Leão do Norte
Chegando aqui, a primeira impressão latente, foi de um mar vasto e uma praia imensa. Até Copacabana ficou miúda diante de sua Boa Viagem. Mas isso pode ser só uma impressão.
80 quilômetros de extensão de praia. Depois, certo silêncio nas ruas, o que até me lembrou Brasília em seus finais de semana entre quadras. Mas eu estava em terras nordestinas, mar aberto, arrecifes, tubarões famintos atraídos pela construção de um cais que virou ponto de matadouro de animais, onde seus dejetos eram lançados ao mar. Atração fatal, sangue e fome.
Recife das águas e ilhas que entrecortam a cidade por suas pontes que ligam o Recife Antigo a todo restante da cidade. Mar quente-verde, mangues quase extintos cercando o centro da cidade. Povo de sotaque arrastado e forte. Pouco percebi da musicalidade que busquei: Nação Zumbi, Chico Science, o que se ouvia era o forró malvado, maldito para quem não gosta.
Disseram-me que em Olinda encontraria mais afinidades, tanto na área musical, quando no artesanato e na arquitetura banhada a História. Lá, meu contato foi com a amanhecer, onde o sol se exibe às 5h00 da matina, e o alvorecer inicia-se às 4h00. Provocada por dois olindenses, um bêbado disposto a ganhar mais um trocado com informações sobre o local, o outro, guia turístico faminto e falido nas ladeiras daquela cidade.
O primeiro me abordou e me intimidou um pouco. Inerte diante do desconhecido, o sujeito vira e diz: “Como você vem ao Olinda e não quer ouvir um nativo falar de sua terra?”. De fato o sujeito tinha toda a boa razão argumentada diante de minha turística curiosidade. Contava-me histórias do “santo do pau-oco” e suas muitas riquezas levadas à Holanda, depois do Português embasbacado, exclamando: “Ô q’linda!”, daí o nome de Olinda.
Até a idéia do Chico morto no poste de sua cidade, intrigava meus olhos, além dos tantos fantasmas do carnaval alastrados pelas ladeiras de paralelepípedos, dos mosteiros infestados de ouro maciço, da Igreja da Sé no alto da serra, do silêncio das manhãs quebrados por barulhos dos sinos das igrejas esquecidas e suas freiras abrindo as janelas para os primeiros raios da claridade do dia.
Pra mim essa cidade tem sons de Lenine, Maracatus, Frevos, Mestre Ambrósio, Alceus e tudo que inspira um pouco de efervescência. Como numa fórmula entre o que experimentamos e o que somos de fato – um signo cravado na crença. Sem esquecer da comida, no sabor que ela nos traz, no apetite devastador na saliva, na vontade que dá.
Recife das águas vindas de todos os lados, do cheiro fedido de suas entranhas, da violência apurada em suas esquinas, em sua gente, dos mangues e o que restou das casas erguidas sobre o caos. Dos poetas representados em todos os cantos da cidade cortada pelos Rios Capibaribe e Beberibe, no Marco Zero, nas estátuas e pontos de poesias, coisa de grandes cidades, que não param de crescer, do mercado imobiliários em expansão na orla da praia, das linhas do bondinho que um dia ali transitou, do tráfego insistente de suas avenidas abarrotadas de multidões, do maior bloco de carnaval do mundo – Galo da Madrugada, e toda sua festividade, de todo o resto que não pude conhecer.
A maior impressão que ficou do Recife, foi sua gente, comunicativa, “avexada”, a nossa Veneza brasileira banhada de águas, sua intimidade com o mar, que avança sempre em direção a terra, sua bandeira exibida com orgulho por todo o Estado e fora dele. Fascina-me ainda mais, o que é o Recife e o que ainda pode nos causar em curtas distâncias.
Por enquanto, “o inferno nem é tão longe, nem depois de onde nada se esconde. Mas perto do que distante, não demora muito ele chega pra qualquer um”. Mas o paraíso convive lado-a-lado com esse carnaval de alegorias vastas, banhando os olhos de quem passa.
Recife, cabe muito mais de sua loucura em cada um de nós.
eliz pessoa
sábado, 30 de agosto de 2008
Alguém os assiste, percebendo os barulhos dos vizinhos, a pisada no corredor e o anúncio do jornal da noite. Em meio a tantos verbos, alguns pensamentos pensam sozinhos, depois se dilatam provocando o ser que os experimenta, enquanto outra coisa faz sombra sobre as linhas do caderno e as mãos seguem dando contorno a personalidade da letra, revelando distúrbios acentuados de alguém.
Literalmente a noite se permite, fazendo graça e arriscando a tinta de uma caneta novinha em folha, fine 0,4 - importada de Germany.
Caberiam outras cores e alguns carnavais das palavras, mas elas, muitas vezes só fazem confundir, principalmente em línguas destreinadas.
Ah, mas como é bom escrever sem princípios, salientar a mania do ser, mesmo quando a correria rouba o tempo, trapaceia a alma e saí por aí, nos devaneios das noites de uma cidade.
Mas... E se tudo terminar num segundo? E nenhum rabisco servir de atalho?
É... Nem sei o que passa num descuido-cuidado em nós.
Enquanto isso, os gatos já descobriram o mistério que havia por traz da porta e se perderam de dois olhos desfocados, míopes, quando a distância é a única palavra.
eliz pessoa
sábado, 23 de agosto de 2008
Mas não há receita para as coisas do tempo, e só ele é capaz de desfragmentar os instantes.
Cadê àquela alegria solta nas ruas? Ou ainda, àquela musicalidade solta no ar.
Cadê?
Agora que os livros são meus reais amigos, porque me levam para outras vidas, noutras culturas, que me trazem vertentes que não cabem em mim, e agora só há tempo para o silenciar, e o reencontro com as palavras da literatura, ou para as viagens para as entranhas do Brasil, para as cidades velhas do tempo e para a passagem de rostos anônimos, envelhecidos de histórias, remarcados pelas linhas do existir.
Eu não sei o que aconteceu aqui, mas eu não sou mais a mesma, e talvez nunca volte a ser.
eliz pessoa
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
Escrevo para me recompor, para não morrer mais um pouco, para não me desenganar.
Ainda assim, reparto em cada texto novo rastros de minha essência desnudada em rabiscos.
Escrevo para parecer à mesma e não perecer no silêncio, nos labirintos desfragmentados ao longe. Porque não aprendi a fazer de outra forma, não sei desfalecer senão for pela palavra e suas curvas acentuadas.
Escrevo para me mostrar, depois recolho todo o texto exibido em porta de geladeira e finjo não tê-lo escrito.
Escrevo e reescrevo para, acima de tudo, aquietar o pensamento, silenciar a alma, e me encontrar comigo, fugir do mundo, das gentes, das horas.
Escrevo por puro exercício, de não saber fundo, do fundo da gente.
Para esquecer o paraíso e para ficar mais próxima da real verdade.
Escrevo a contemplar o que ficou de mim, ante de escrito.
eliz pessoa
sábado, 2 de agosto de 2008
L-a-c-u-na
foto: Bruno Abreu
Eu me empalideço, depois amoleço com a tarde que caiu logo há pouco, sobre a linha tênue entre o horizonte e meus olhos. Não há poesia, sentimento vasto, nem imensidão sobre o céu da cidade. Assim como as nuvens rosadas, não resgatam outras memórias, nem refúgio tardio na gente.
A hora é de lacuna, deserto, livros sem palavras, papel sem rabisco, cartas não escritas.
Mas hoje, não cabem desejos, nem línguas, nem nada.
Talvez mais tarde eu me recorde outra distância e esmoreça da mesma verdade.
E assim, quando tudo isso se fizer inteiro, outro dia nascera dentro e fora daqui.
Eu não me esqueci do último presente, eu não me esqueci de nada.
Embora pareça, eu não sou tão amuada, nem me esquivo fácil, nem deito tanto, nem me presto em meio a caminhos que não me pertencem.
Eu nem mesmo me lembro da última sinfonia naquela sala, porque desaprendi um texto novo, desarticulei o pensamento e desatei a lidar com a indiferença. Porque eu nunca fui indiferente a nada, nem as pessoas vendendo balas nos semáforos coloridos pelo sol, queimando testa de gente cansada, nem dos índices de miséria crescentes no mundo, nem a tudo, nem a nada.
Não aprendi um canto novo com a dor, nem me resgatei em meio a ela, nem mesmo me arrependi dos caminhos vividos. Eu não sou de ferro, nem ninguém.
Eu não ando atenta a coisas que não me interessam, nem ninguém.
Eu não tremo mais quando ar me falta, mas ainda sou tão inteira, tão vasta que não caibo só aqui... dentro da casa.
Ainda assim, eu me vingo da minha ingênua idade, e o tempo dilacera o coração, rasgando a emoção do poeta. E eu que pensava que ele tinha morrido, sufocado pela pressa do vento adentrando aos pulmões.
Eu, que tanto acreditei na inspiração da palavra para dizer a coisa certa, como se a coisa certa houvesse um dia de fato existido na vida de tanta gente.
Eu, eu, eu... A verdade é que não há mais verdades a serem ditas, muito menos proferidas em aglomerados nos centros de grandes cidades.
Não há espaço raso entre a gente... senão eu grito, ou me calo.
eliz pessoa
quarta-feira, 30 de julho de 2008
Retalhos
Dentro de cada detalhe de nova estação, não bastam olhos atentos, alegres e despertos.
Bem mais que tudo isso, as cores florindo lá fora são riquezas para um coração ingênuo, inacabado.
Nas falas, frestas de línguas alienadas, muito barulho, rumores de vidas alheias, seguem incansáveis como se a lida expirasse em segundos. E o homem em frente a si mesmo torna-se inegável, intrínseco.
É preciso a distância e o atalho bem próximo, retalhos de outro na rua.
Depois não vale mais nada. Nem à hora, nem a horta, nem a mesa farta do domingo.
eliz pessoa
domingo, 20 de julho de 2008
De vez em quando
Ando preguiçosa demais da conta, escondida, conversando com as quatro paredes do quadrado de meu quarto. Ali dentro, sambo com se estivesse em plena Marquês da Sapucaí, no recudo da bateria da Mangueira – atalhos do coração, e canto sorrindo para os quatro cantos das mesmas quatro paredes pintadas de verde, na esperança lá de casa.
Depois, recito poemas que eu nunca escreveria, por pura falta de jeito pra coisa, e os clamo como se fossem meus, e choro quando neles me encontro.. Não de dor, ou sofrimento, mas pela grandiosidade da palavra escorregando aqui.
E aí calo, fico quieta no sossego meu. E adormeço na generosidade da cama, entre as quatro paredes escondidas lá em casa.
eliz
terça-feira, 24 de junho de 2008
(Foto por Érica Assunção)
Desarticulando a palavra, arranhando um texto novo, desarmando o papel, alinhando pensamento, modificando a escrita, desmontando a casa, vasculhando cadernos, inventando coisas... Respirando profundamente, pirateando outra idéia, envelhecendo constantemente, suspendendo alucinações, endireitando as costas, assistindo ao crescimento dos cabelos, expirando corrida, velocidade, nado e nada, aquietando sentimento, silenciando sons, retrocedendo um pouquinho, desligando a cabeça, D e s c o n e c t a n d o p o e s i a .
eliz pessoa
sábado, 21 de junho de 2008
Depois...
De tanto crer em Astrologia, Numerologia, Bruxaria, Simpatia, mal olhado, oração, reza, religião, intuição... De tanto acreditar no impalpável, nas coisas que eu não via, acabei por não ver o que não acreditava.
Então os mitos, crendices, desejos escorregavam escada abaixo, e o que ficou foi a transformação dia-a-dia.
Depois de tudo, a bobagem derramada das mãos. E agora perdi o tino, o jeito para a coisa, e resolvi bem amar o silêncio, fazer as pazes com a solidão, com o sossego e fiz morada em casa.
Depois fui ficando egoísta, pra dentro, deixei de lado o popular, as gentes, as horas e notícias. Pouco a pouco fui desligando as coisas, me enclausurando nos sons que vinham de todos os lados.
Depois que tudo passou, não quis mais lembrar as sutilezas no caminho, nem o arranhar das pedras sob as solas dos pés descalços, nem mais a sensação arrepiante do mergulho frio.
Fui me decompondo, desfragmentando, descamando a pele, descascando um pensamento, me acostumando à praticidade, sem sombras ou dúvidas.
Depois algo ficou cru, perdendo o cheiro, desaprendendo a melodia, o ritmo.
Depois, bem depois a nota se perdeu e o som acometeu minha alma, encurralou-a num beco e não havia saída. Sem pretextos para outra inspiração.
Depois, bem depois de tudo.
eliz
terça-feira, 17 de junho de 2008
Nu
No silêncio resta muito da gente, labirintos, idéias vastas, quietude, re-começos, reencontro de palavras mudas, nó, textos esquecidos em cabeça de gaveta, no esconderijo de armário, dentro das páginas de livros.
No silêncio alguém se encontra e finge serenidade, depois se olha no espelho e espelha o tempo, presente de tudo que passa.
No silêncio a solidão espreita, e se esconde na curva da casa de tinta descascada, quina do quadro no retrato exibindo um sorriso.
No silêncio uma palavra morre, enquanto outra se mata, e bem no canto um gato espreita a hora do nada.
Nu silêncio a vida cisma da gente, sombando nossas verdades e se deleita num pranto novo, com ares de maturidade, depois despenca ao chão como fruto vencido.
No silêncio gritam lembranças, quando a noite se alonga sobre o corpo do dia.
Ah! Mas o dia... Nele não há silêncio, apenas a imensidão do barulho que cala.
eliz
terça-feira, 13 de maio de 2008
Verso
É ele mesmo que segue invertendo a ordem inversa das roupas,
do fim ao início do texto,
da frase,
da ânsia em saber o final da história,
atropelando o meio fio, engolindo a nota.
É o ritmo que inspira o rebolado da moça,
desenquadra um pensamento e o liberta nas ondas do som.
É a perspectiva que desembaraça,
descruza,
desata os medos,
apelos de nós.
É a infinitude do agora vivido,
o improvável,
o não concretizado no curto espaço tempo entre o ontem e o amanhã.
É o ato, quando nele se encontra o laço.
É a surpresa que reside um presente.
É a música de um violão inquieto,
traiçoeiro por não saber a mesmice dos dedos,
que cintila a alma do músico.
É a métrica, quebrando verbo – início de tudo.
É o tudo, onde não há nada.
É de nada, a nata do homem.
É o não ser.
É quando não há.
É o findar descalçado de pés derradeiros.
É e não é, o limiar das palavras rasgadas nos versos do lixo.
eliz pessoa
sexta-feira, 9 de maio de 2008
Re-cordare
Porque quando pisei os pés sobre as miudesas de sua morada, um silêncio me colocou em mim. Sem a sua presença irônica, nas manhãs de todos os dias, alguma coisa se perdeu aqui.
E por um instante um eco se fez ouvido nas quinas, esquinas de seu quarto, e a cama não me convidou para ali me deitar e brincar de coisas escondidas.
Porque quando te deixei ali, me esqueci do verso e me perdi na linha.
Depois tentei inventar um café, cortar outra fatia do bolo, e embora os ritos fossem arriscados sobre a mesa coberta de toalha vermelha, nem assim alguma magia se fez presente, apenas a quietude do lugar, a vastidão da lembrança e um texto digitado em tela de computador.
Resisti ao medo do medo, trancada dentro dos quadros do apartamento de janelas fechadas, onde cortinas escondiam os segregos dos vizinhos e a voz Sosa de uma Mercedes vestiu-se de companhia.
Depois de tudo arrisquei outros medos, do espaço, da saudade, da distância do terreno lá fora, da árvore erguida sobre o nada, do rasgo no peito, das nuances da vida, das travessas e do caminho.
Embora não tenha sabido um dia, mas você nunca me tirou o fôlego, não me fez perder o juízo, o tato com o texto, nunca me pos desvairada no caminho, nem mesmo ardendo em dores de febres astrais, nada de desesperos, de cenas descompassadas, nada disso em mim. Nem ao menos te idealizei um dia, não te imaginei em minhas mentiras mais assanhadas, nem desenhei tua face nas verdades mais escondidas.
E por isso mesmo que és muito de minha paz.
Minha criança vive do seu lado e brinca com o menino do seu coração, como se o tempo fosse nossa grande diversão, ainda que saibamos o quanto ele nos custa.
E foi no silêncio que você me encontrou sem dizer nada, e disse tudo.
eliz
domingo, 4 de maio de 2008
Eu sei, eu sei como anda se sentindo em relação a você mesmo, mas de qualquer forma você vai viver e morrer se sentindo muito... Ainda não há outra maneira de estar em si.
Por hora haverá muitos outras contradições, alguma falhas, outros acertos, muitos medos (e há também quem diga que não tem medo de nada). Eu duvido, contesto e bato de frente! Se bem que, para quem acredita em muita coisa que não vê e acaba duvindando de tudo que enxerga, poderia crer em alguém que não tem medo de nada.
Quanto ao mundo, ele é como é, e algumas coisas podem modificar o percurso, basta insistir. Mas você não tem jeito, fica nessa de repetir ações caducas, continua ignorando a língua, não se interessa em se incomodar com ela, persisti no erro da mesma e ainda diz por aí que deseja entendê-la com profundida. Coisa que também duvido.
Dúvido sim! Porque não há vontade quando não há mudança. Daquelas que se tornam práticas diárias, vistas e percebidas em volta.
É como ouço muito por aí, gente que enche a boca pra dizer que tem consciência da questão do lixo, do trânsito, etc., e tal, mas que não muda a ação prática em relação a essas coisas não são conscientes de nada, não passam de uns lorotas, agem com inconsciência. Porque estado de consciência é algo que se reflete nas ações cotidianas e começa no íntimo.
O problema ao meu ver é que confudem consciência com informação. O sujeito pode ser bem informado quanto a uma questão, mas só será consciente dela quando modificar sua ação prática em relação a mesma.
Agora voltando, tenho te notado ultimamente muito televisiva, meio hipnotizada pela imagem do monitor. Ainda bem que por outro lado, você tem algumas escolhas (ao meu ver) interessantes quanto ao que resolve assistir. Mas o que está te atrapalhando muito, é falta de foco. Por exemplo, você ama ler, ama os livros, as hitórias de vida dos escritores, os poemas, as frases e tudo que se refere a literatura, pricipalmente latina-americana, mas é só esbarrar no meio do livro que muda o foco, distraindo-se com outras coisas. Concluir que é bom... nada.
Não adianta ficar nessa de enganar-se querendo ler, três, quatro livros simultâneamente.
Você não dá conta, e nem tem tempo para fazer isso com maestria. Então pare e resolva de uma vez por outra, ler um livro de cada vez. Simples assim, como se aprende quando criança.
Engolir uma idéia, só vai te fazer bem, se for vagarosamente mastigada antes da colocada para dentro. É preciso curtir as coisas, como cachaça boa. Senão nunca vai conseguir cuspir nada de qualidade. (Cuidado com isso!)
Quanto a tv, não acredite em tudo que vê, ouve ou contam. Há que se aprender a discernir muito bem uma intenção da outra, coisa que a sua escola e a dos outros não ensina.
Você precisa galgar com vontade um caminho novo, árduo, que exigirá muito disciplina, muita leitura de diversos assuntos, muito cuidado com a manifestação das palavras. Aprender como colocá-las em mesa, em papel, em esquinas e acima de tudo, amá-las e perdoá-las também porque elas não são fáceis de lidar. Por isso esse tal de amor e vontade de aprender com elas. Sem esses dois substantivos a planta não cresce.
O que estou a dizer não é bem uma receita de bolo, até porque se fosse patentearia a receita e ganharia dinheiro com ela, mas como você resolveu (lembra que me disse isso de maneira bem clara?) que o seu foco agora é cuidar do que elas dizem e não proferí-las para ferir alguma coisa, ou alguém, mas sobretudo construir-se com elas, crescer e compreendê-las em essência, parágrafo por parágrafo, linha por linha, caso por caso, então lute por esses “detalhes não tão pequenos de nós dois”.
Se você resolver desistir dessa peregrinação, terá perdido o princípio primordial do, pagar para ver no que dá. Agora, se passar dessa decisão e seguir a frente, terá vencido a primeira estrofe.
Saiba que não tenho que acreditar no que você diz, muito menos duvidar. Não cabe a mim tanta ousadia, nem recitar concertos, muito menos sensibilizar com poesia. Não cabe a mim nada do que lhe é caminho. Essa é uma escolha sua. Mas como a gente convive muito, o que fica do eu para o tu, é a certeza de que torço pelas suas escolhas, e o mundo é apenas um reflexo nosso, e se realmente for consciente haverá prática, e havendo prática trará vida.
pessoa
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Do contrário
Passei horas pensando rabiscos, arriscando cartas, decifrando lembranças, descruzando pernas, alinhando pensamentos, esmiuçando arquivos, recortando sensações. Segui, como se algumas coisas estivessem enraizadas na alameda.
Depois de horas a fio, a única certeza despida, foi àquela natural das coisas como elas são.
Fico enfeitiçada pela lembrança torta lá fora, pela agulha e seu dançar nas faixas do vinil, e nas vozes de cantores já mortos, ainda vivos dentro da gente.
É tão fácil perder-se no silêncio e deslizar em horas descosturadas no tempo.
Depois é tudo tão tranqüilo nos sábados pela manhã, nas primeiras lembranças da matina, no frescor de um dia desnudo em si, como se o primeiro fosse o instante (que passa).
Do contrário o dia se finda cansado e a atmosfera das pressões sobre põem-se sobre os ombros dos desafortunados.
Penso melhor quando o dia descansa, quando o sapato não aperta os dedos da frente e a roupa vira trapo de fim de lida.
Há que pensar melhor quando o cinto desaperta, quando o nó desata, e a fome se espanta.
Há que se cansar melhor depois de tudo isso.
E quando se pensar ter fim dado aos pontos da linha, as linhas dão ponto no fim – começo de tudo.
É tarde, e a tarde se espanta ainda cedo.
Mas por enquanto, o presente é a presença constante dos meus atos.
Bem por enquanto...
eliz pessoa
sábado, 29 de março de 2008
Rio X Aedes Aegypti
Mas o que se ignora em grande escala é a importância suprema que o cidadão tem no combate ao mosquito transmissor da doença, porque na maioria das vezes (e não estou falando apenas do cidadão carioca mais do povo brasileiro) é o nosso próprio descasso quanto a parte que nos cabe. Isso não se revela apenas no combate a Dengue, que pode e deve ser combatida com medidas simples e eficazes, mas em relação ao lixo, jogado de qualquer maneira em qualquer lugar, assim como na posição que tomamos dentro do trânsito, colocando em risco a vida dos outros, sem respeitar leis, no péssimo e incompetente hábito dos “espertinhos” que sempre dão seu jeitinho para se dar bem fazendo pouco...
É sempre muito fácil se apontar “dedos” para os superiores Chefes de Estado, mas de nada adianta o bom funcionamento de atendimento na rede pública de saúde, se não houver um combate direto de ambos contra a ploriferação do mosquito.
Mas uma vez comprova-se a infeliz estatística de que é preciso morrer muitas pessoas, trazendo para a dor para nossos lares, para que modifiquemos a experiência em relação aos fatos que nos cabem.
Não há livrando da responsabilidade do Governo na parte que lhe cabe no combate, assim como também não há como isentar a nossa força na luta.
A Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, ano passado já discutia em reuniões internas, da possível epidemia na cidade do Rio de Janeiro (agora realidade) do vírus da Dengue. E de lá para cá o que se assiste é a consumação dos fatos em “Via Crucis” do que antes já era previsto por autoridades do Estado. Este sim deveria ser o “escarro” cuspido aos nossos representantes! A responsabilidade que lhe cabe de alertar e informar à todos dos caminhos a serem traçados no combate a doença, e dar condições práticas para que a população combate de frente o problema.
Infelizmente nem de um lado, e muito menos do outro as mudanças de comportamento são constatadas. O que se vê é a expansão de uma doença que mata em pouco tempo, sem discriminar credo, etnia e condição social.
E por enquanto, um pequeno mosquito ainda é o grande vilão da história.
eliz pessoa
segunda-feira, 17 de março de 2008
Árvore
Ainda é noite e a quietude da madrugada de domingo decifram impulsos, retêm a hora e tranqüiliza os poros de um corpo inerte sobre o edredom pesado sobre a cama.
De fora da janela, àquela velha conhecida de todos nós – uma linha de horizonte é quase encoberta por uma névoa flutuante sobre os ares da madrugada. E ainda assim, ela toda torta, enfeita o terreno ao lado.
Mas no terreno aqui dentro arde o sincero desejo de preservá-la das forças de mãos humanas, inteira sobre a terra vermelha.
Nada de concreto, além dos já existentes construídos sobre cemitérios de espécies nativas do Cerrado, assim como ela.
Por isso é que a desenho, que a fotografo, que a quero viva enquanto há vida aqui.
Sobre as lentes de meus olhos míopes, ela reina quando o dia amanhece.
eliz pessoa
“Relata-se que são Francisco pregava aos peixes e as aves. Se a lenda é verdadeira imagino que os peixes e as aves, ouvindo a pregação do santo, riam e sorriam discretamente para não ofendê-lo. E isso porque não se pode pregar a seres perfeitos. Prega-se a seres imperfeitos para que eles se tornem perfeitos. Acontece que peixes e aves são perfeitos, são felizes naquilo que são. Peixes não querem ser aves. Aves não querem ser peixes. Mangueiras não pensam jabuticabas. Jabuticabas não penam mangas."
Rubem Alves
terça-feira, 11 de março de 2008
Arrebenta um atalho, desvia o caminho,
Segue o dia sobre linha tênue do horizonte vasto,
Um irrequieto calça calçadas atropelando um pensamento...
Brilho de esquina escura, fim da tarde clara, noite adentrando o tempo.
Surto de um minuto vivido, horas que se estendem sobre a mesa repleta de folhas.
Secas vidas de oprimidos.
Cólera e vontade suando frio na testa do homem.
Tardiamente, o tempo se expira.
Metade de tudo que passa.
É hora, quanto a hora basta.
eliz pessoa
sábado, 1 de março de 2008
Benazi
Um gole de H2O descendo pelos canos da garganta cantadas, enquanto um pensamento faz cócegas em imagens de Girassóis, boiando a margem de tudo...
A casa (literalmente) de pernas para o ar: cama, cadeiras, sapatos, penelas e pratos, nos intervalors de sábado. Cheiro de limpeza afetando a malícia das narinas.
Poeira armazenada nas quinas – esquinas de dentro de casa – sons de crioulous, desenhos saídos da janela de fora, Cerrado nú, chuva fina lambendo a vegetação, alguns arquivos escondidos num armário de estante, no instante que passa. Pés descalços sobre sabão em pó, azulejo escorregadio – escorregando no r’s.
Rima desiquilibrando o ato sobre a linha.
Paulinhas, Luíza, Marinas...
Enquanto a loucura se expande o oriente se abre, como mulheres em frente ao desejo.
Espaçosos pensamentos, afrociberdelia, afoxés embaianados dons de Brown.
Artifícios de palavra,
ironia do destino,
estradas de preceitos largos,
impulso relevante do tempo,
mães de partos sem fim,
enquanto o tambor engole o oco de tudo.
Enquanto o verso se aninha,
por e n c a n t o...
quanto(s) pensamentos aflorados?
eliz pessoa
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008
V I D A
Vida que acorda cedo e que caminha nas calçadas, nas patas de cachorros, no cuidar das domésticas. Vida exercício dos dias.
Vida que se sente nas quadras e no movimento da ginástica das “jovens” aposentadas – meninas do tempo.
Vida que transita entre os carros, arriscando-se nos dribles do perigo.
Vida das mochilas carregadas nas costas dos adolescentes, escondidos em agasalhos de frio, até o tardar do meio dia – metade da lida.
Vida fumada nos tragos do cigarro, nos labirintos dos dias, nas muitas horas de interrogações, no prazo limite de pagamento com desconto, nas filas dos postos de saúde, nos autos custos de vida.
Vida que amanhece nos sonos dos mendigos, nos outros cães – latindo nas sacadas de apartamentos, ou ainda nos pássaros presos em gaiolas, contrastando como os assanhados Periquitos que voam em bando de uma árvore a outra desta cidade.
Vida que se segue no abismo de hospitais, sobreviventes do dia.
Vida que nasce na vinda do Pedro de mãe (s) Catarina (s), vida de luz, vinda da vida.
Vida que trabalha na força de braços fortes, que grita na garganta do feirante no centro da feira, vida mês a mês, dia-a-dia.
Vida brotando em todo o canto que vejo, no anoitecer silencioso da noite.
Vida onisciente, onipotente e onipresente.
Vida, ida de tudo que finda.
eliz pessoa
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
Botecos
Ela chega, guarda-chuva sobre as mãos, cabelo curto lambido, agasalho sobre os ombros já fadados pelas leis da gravidade e um certo ar de desânimo pairando junto.
Ele se alegra quando a vê. Ela se mostra indiferente, mesmo que ainda se movimente ao encontro dele. Quando o sujeito a abraça, ela continua “imparcial” – dura na queda.
Sentados frente a frente eles silenciam.
Do outro lado do espaço um outro sujeito degusta bebida barata, arrisca outro folheto e se esconde num som de MP3, assistindo o movimento do mundo por outras ondas.
A frente, uns rapazes insinuam gestos femininos e por alguns segundos tenho a impressão de estar no bar do outro lado da rua...
Ao lado um casal. Ele como quem vem do funcinalismo público – pura distorção de conceitos – ela, como quem sai da ginástica. Se encontram em contextos diferenciados do ares daqui. Ambiente popularizado.
Enquanto ela saboreia, ele imagina, dando asas aos filtros de “imagina ação.”
No meio de todos, duas alianças – três casamentos.
Dois casais. O da frente, saturado, enquanto os de lado, sincronizam.
Em meio a tudo, um solitário se acompanha, muito bem resolvido - diga-se de passagem - de um outro gole de cerveja, casadíssimo com a boemia.
Atrás, duas solteiras soltas na lida. “Bem dita és a fruta entre os homens, e todos se divertem...
Quando o dedo se levanta no apelo de mais uma garrafa de “breja”, um olhar apreensivo se desliza sobre a mesa, enquanto fumaças de cigarros passeiam pelos ares da granita no caminho.
Depois, um brinde a Sampa e os cacarecos de Santa Efigênia vem ao meu encontro.
É noite de sexta-feira, janeiro de 2008.
eliz pessoa
segunda-feira, 28 de janeiro de 2008
Há
Há tantos amores a serem sentidos,
Tanta poesia de tantos poetas desconhecidos...
Há um Drummond sentado a calçada,
Tantos pés descalços,
Tanta harmonia,
Tanto querer dentro e fora da gente.
Há tanto haver em tudo isso,
Tanta simpatia bocejando lá fora
E muitas alegrias estampadas no abismo...
Há tudo isso e às vezes não há nada,
Só o nada faz sentido.
Mas há tanto o que fazer,
Tanto que haver e tanta vontade desposada nas ruas,
Nas nuas, nas tantas coisas que ainda há de haver dentro e fora da gente.
E talvez por isso, há tudo isso enquanto passo num piscar de segundo haver.
eliz pessoa
sábado, 12 de janeiro de 2008
Mãos
Foto: Ana Franco
Mãos que alimentam almas, mergulhadas em águas de sonhos, tantos... E são Rios de engenho, transparências e uma infinidade de canções que dançam em cordas vocais - risco do absurdo no surdo ouvido.
E ainda quando a tarde se abre sobre todos desnudando céus de uma cidade intensa, depois de silenciosas tardes de domingo, no vazio de quadras, o brinde – barulhos de bares dão tons aos semitons da língua afoito do outro, sobre notícias vasculhadas na pressa do naufrágio da última s e m a n a.
E embora o mar esteja tão longe, como se realmente estivéssemos isolados por terra de tanto mundo, ainda assim, os ventos resgatam sensações tantas. Outro Belo Horizonte, como se o cheiro das águas sobre os pés das montanhas, aqui estivessem. Bastando fechar os olhos, depois de escurecidos, a mente se expande como se tudo estivesse ao alcance de pálpebras adormecidas num segundo.
O tempo presente redigido em outros tecidos, como mãos afoitas de moças costurando detalhes.
Valei-me!
eliz pessoa
terça-feira, 8 de janeiro de 2008
Cinco pra meia noite
Por aqui uma certa sensação de culpa assola as idéias, porque um felino fora solto, por mãos de escritor, depois de castrado sua sobrevivência - o que de mais precioso um ser vivo guarda em si. Talvez seja o peso da consciência mais atenta ao que circunda ao redor... Talvez.
Mas não há voltas quando cicatriza o rasgo.
E os raios ao longe trazem consigo a vontade de ver chuva caindo na janela do lado de fora e algumas intemperânças desmontam o ânimo do trabalho varando noites.
Algo se assemelha com as contradições do clima... É a chuva que se insinua e não desaba, ou o sol que raxa cuca de homem vazio.
Tudo por aqui ecoa trovões sobre nuvens rosadas da noite.
Em meio a algumas sensações cotidianas, como as costas reclamonas diante do micro, os olhos já pesados de tanto ver àquela vontade traiçoeira de acolher o livro e ler, deixando pra depois o que seria pra ser feito hoje, ou outras imprudências de quem ainda se perde ouvindo qualquer coisa que se sinta, em meio a tantos sentimentos acústicos.
No estúdio, as unhas de tinta vermelha, dão cores aos dedos, e a pressa desavisada das retinas, rendidas recolhem outra memória. E esse papo baixo de companhia de letras, não me deixa esquecer que eu estou aqui de passagem, pairando sobre um precipício infinito onde flutuam pensamentos inflamados.
À noite assim que é bom...
É tarde, tenho que dormir.
eliz pessoa
Goiás
Foto: David Sousa
Qualquer outro sonho por aqui se perde tamanha a imensidão do nosso céu, da nossa cidade.
Mas eu nego a parte Goiás que me cabe tão bem, insistindo no erro, na prosa que emperra o caminho e sigo em frente como seu de fato não fosse parte desse estado que me engole e cerca.
De Cora Coralina desfragmento idéias simplificadas de lirismo.
E tão cheio de vida ficaram meus olhos de flores e troncos de um Cerrado, serrado em nós.
Eu sou brasiliense, pra alguns: “Goiano elevado ao quadrado.”
Será que e também carrego mais que um Goiás de amor aqui dentro?
Será que todos por aqui o carregam?
Será tão verdade tudo isso?
eliz pessoa
segunda-feira, 7 de janeiro de 2008
Domingo
Bem-te-vis, Quero-queros despertam o áudio de uma, até então, silenciosa manhã de domingo dentro dos apartamentos.
Ela descansa o ouvido sobre o peito dele, ritmada pelo bater das válvulas do coração.
E o pesar da respiração fazendo amor com o oxigênio, no entrar e sair do ar exercitado nos pulmões.
Ainda é cedo, quando as palavras despertam na cabeça de um corpo em transe, entre os mistérios do sono e o parto da manhã.
Como em letra de canção, “hoje o dia também pousou sobre a minha cabeça e clareou,” desobedecendo à indisciplina da palavra quando nasce adentrando a identidade do ser, encenando outro autor, desenhando outro texto estrábico num ir e vir de um malabarismo de idéias. Enquanto o carnaval fora de época dos passarinhos ainda lá fora e o amanhecer preguiçoso do dia anuncia o domingo, de novo.
E mais uma vez o corpo se ergue envolvidos em movimentos letárgicos e espanta-se com a festa dos passarinhos.
Ela também quer cantar pra acordar a vizinhança inteira, como se todo dia fosse dia de índio.
eliz pessoa
sexta-feira, 4 de janeiro de 2008
Verão
Mas enquanto as ondas arrebentam no litoral amortecendo na areia, aqui, nos grandes centros, o asfalto emana vapor do sol que morre abafado nas ruas das cidades. Enquanto nos escritórios, as nucas das moças travestidas de trabalho, até ousam um pensamento nas retas das tesouras destemidas de desejos. E as sombras, projetadas pelo reflexo lá fora, mergulham os olhos do homem, na proteção de tela, trazendo miragens dos arrecifes de corais, colorindo o fim do dia.
E um sertão à beira do caminho, encapuza a primeira página de um livro, ainda não desbravado pela imaginação afoita de alguém.
É Verão e muitas versões constroem versos novos, erotizados na malícia dos meninos.
E até as tais chuvas da época, tiraram feiras por aqui. Só o Sol – astro de todos eles - é quem reina soberanamente, e por enquanto, as peles já cansadas na claridade dos dias, referem-se às mudanças climatizadas pela mídia, experimentadas nos poros de cada um de nós.
Há tanta luz lá fora.
eliz pessoa
quinta-feira, 3 de janeiro de 2008
Tudo novo de novo
Foto: Luiz Fernando Rodrigues Leite
Se fosse em “Sampa” o movimento já se manifestara há tempos.
Sinceramente, me assusta um tanto essa folga desmedida de tantos... Não menos à toa que outros muitos almejam uma poltrona para “mamar nas tetas” do funcionalismo público. Obviamente, e sem perder o rebolado, outros levam a fama, que nada faz jus ao trabalho continuado, mesmo após as festas de final de ano e ainda assim com a solidão da cidade aparentemente tranqüila.
Aqui, o ano inicia-se nas diretrizes dos novos orçamentos, nas possibilidades de novos impostos, a expectativa do que a por vir e certamente virá, cumprindo o caminho que se estende por inteiro quando nele calçamos os pés, calejados em sapatos de salto alto - elegância de calos duros.
Mas as vontades, que são muitas, de modificar os aspectos raros, continuam latejando por aqui. Só para testá-las as tentações se apresentam, então, a carne que não pretendo rasgar com os dentes, vira convite pra churrasco de domingo, o cuidado com os treinos na água ainda brigam com o corpo preguiçoso sobre a cama, assim como o transporte sobre duas rodas e a “magrela”, um tanto denotada se enquadram em todas as expectativas presente. E muitos outros propósitos acentuam embaraços fios no cabelo.
É não é fácil começar de novo, mas que bom podemos começar sempre que possível.
Tudo novo de novo...
eliz pessoa