terça-feira, 11 de setembro de 2012

O cara, a cicatriz e a palavra



                                                                   (Fonte: Google Imagens)


Por volta das 23h15 entra um passageiro. Subiu pedindo ao motorista para entrar por trás. Levantou a camiseta para exibir um corte que ia do pescoço até o pé da barriga. Tudo costurado. O corte era tão profundo que os pontos pareciam dá nó na pele do cara. Cena esquisitíssima.

O motorista cedeu carona ao sujeito, que entrou e começou e puxar conversa com o cobrador e a contar umas coisinhas... Falou do corte, de como acordou no hospital completamente anestesiado, ainda sem entender o que havia acontecido, disse que não sentiu muita coisa, que a parada da anestesia era da boa. Mas em momento algum falou quem causara o ferimento ou como se deu o rasgo. Disse também, que se antes ele tinha a possibilidade de viver até os setenta anos, agora essa expectativa caira para uns 50, e olhe lá! Inquieto, perguntou ao cobrado quantos anos ele tinha, o cobrador respondeu que 28. Sujeito responde: tá velho já, cara! Ele tinha 22 anos, mas estava acabado. Falou que a juventude se achava imune aos fatos, e principalmente a vida, mas que não era, e que a vida dava um jeito de mostrar o quão frágil são as circunstâncias. Em especial, as pessoas. Que tudo é uma ilusão de perspectiva.

Falava com fissura, como quem tenta engolir o mundo numa só palavra. Como quem tem medo de algo, agitado com a vida, fugindo da sombra que acompanhara. A sua própria. Depois, virou-se para o motorista, puxou a corda do sinal, aproximou-se da roleta, agradeceu, dizendo que Deus o acompanhasse. Virou as costas, e só vi o número nove em sua camiseta listrada. Desceu na altura da quatro norte, deixando a lembrança cortante da cicatriz e suas ideias devastadas. Por um triz, enquanto tudo passa.


elizpessoa

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