segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Segunda-feira



                                                                         (Fonte foto: Google Imagens)


Era apenas uma segunda-feira, como tantas outras, onde aquela preguiça exacerbada de tudo tomava conta da essência da gente. Ressaca da noite dormida em picados, da vontade de deixar o despertador tocar mais um zilhão de vezes de cinco em cinco minutos, em dozes altamente homeopáticos. Decidi resolver as coisas, correr atrás do tempo. Esvaída de mim e quase cega, corri por outros atalhos dessa cidade fadada à rotina.

Saltei do ônibus na plataforma inferior da rodoviária, me misturando ao turbilhão de outros trabalhadores, tudo ao mesmo tempo agora numa simples manhã de uma nada modesta segunda-feira. Eles, abandonados a própria vontade de não cumprir regras, de se perder repentinamente, dormiam um sono pesado e absurdo. Largados na calçados como indigentes, lembravam os personagens de Gutiérrez. Secos, sujos, maltrapilhos, mal amados, fedorentos e completamente inocentes em sua perdição. Para onde o mundo dos sonhos os levaria além de tudo isso? Não sei, e de fato não sei muito sobre as coisas. Há muito que as deixei como coisas que são.

Eles eram como coisas ali, objetos humanos adormecidas no asfalto. Pernas abertas, uma sobre as outras, escrotos à mostra, indecências... A privacidade ao Deus dará. Dois homens e uma mulher, serem inacabados pela vida que escolheram e que os encolheram de vez.

Em transe os operários do sistema, seguiam suas rotinas de formigas obreiras, atravessando ruas, pegando conduções abusadas, caras e desonestas, pagando um alto preço por suas escolhas, olhando a vida como uma rotina que cega a gente. Pra mim o pior não era às cegas e obedientes formigas que trabalham, porque elas em si somente seguem. O maior problema era o meu olhar sobre o mundo. Olhar angustiado, apertando um nó na garganta, olhar de tpm feminina, onde tudo fica bem mais sensível e evidente. Olhar que não para de provocar muitos pensamentos, deturpar ideais e questionar a si mesmo.

Eles, largados às ruas, desistidos do destino, de linhas traçadas e retas, experimentando a vida em lugares comum de todos os gêneros, sedentos de mais pedra, mas ópio e mais nada. Vivo como mortos sobreviventes da guerra que nos tornamos quando nos transformávamos. Que guerra é essa? Que carapuça foi essa que vestimos sem perceber que havia dor? Que monopólio foi esse, impostos sobre nossa existência?

Indecentes, vulgares, sujos, mendigos, que não mais são enxergados, onde os governos preferem escondê-los, enquanto o mundo brinca de falar sério.

Pensei no sete de setembro e toda a putaria da festa. Provavelmente arrumarão um jeito de escondê-los no dia. Mas eu preferia que eles estivessem à mostra, como os vi nesta manhã de segunda-feira. E como cenário, poder exibicionista da minha Brasília, um tanto incrédula diante aos fatos.

Gostaria de vê-los fedendo em meio as trabalhadores, para que assim incomodassem um pouco mais outros olhares. Quem sabe encontraríamos um pouco da verdade que não se esconde do mundo, enquanto nos enganamos no simples e desonesto: não é nada, tá tudo bem. É só o mendigo, e só.


elizpessoa 

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