sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sobre o que vejo


                                                                      (Foto: fonte Google)

Eu vi.
Vi com os olhos da alma, o terceiro deles.
Vi, com a intuição, com a sensação rasgada no peito.
Vi, com a essência.

Agora, vejo... vejo um mundo novo desnudado em minha frente.
Vejo pelos sonhos que me anunciam fatos novos, me alertam perigos em forma de cachorros raivosos, galos  brigões, carros deslizando no asfalto solto sobre meus pés.

Eu vejo e peço num salmo, outra proteção sobre o infortúnio.
Peço ao anjo um novo cuidado, para que eu não me perca no caminho enquanto vivia.

Eu vejo, claro e completamente, tudo ao mesmo tempo agora.


elizpessoa

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Choveu




                                                                            (Fonte: Google Imagens)


Choveu como aclamado, e além do esperado.
Choveu forte e tempestivamente.
Choveu lavando os vidros carregados de poeira cinzenta, ar cinzento, palavra cinzenta.
Choveu nos gramados ressecados, estorricado pelos raios do sol de um ano inteiro.
Choveu numa sexta-feira de eventos, e ninguém dançou a dança da chuva, nem alimentou raízes de novas esperanças.

Choveu num apelo seguinte, lavando as ruas da cidade, molhando o teto das casas, o topo dos edifícios, a bicicleta, o desassossego, a metonímia das coisas, a coisa toda.
Choveu no olhar das crianças, nos cabelo das meninas, sobre a barba de alguns homens, na superfície infantil, no pátio do colégio.

Choveu sobre as árvores, flores, folhas e frutos.
Choveu sobre o silêncio, sobre o barulho da vida que corria lá fora.
Choveu aqui dentro, em cada detalhe de uma renovada argumentação.
Choveu enquanto, paciente, assistia o escorrer das águas na quadra.
Choveu enquanto alguma coisa se materializada no asfalto.
Choveu sobre o calor, sobre o meus também olhos ressecados.
Choveu na cabeça de ideias constantes, na malícia, no inesperado, no anúncio de uma nova estação.

Choveu na minha Primavera tão quente.
No meu colorido tão quente.
Calorosamente sobre a minha embriagues, sobre o lago, mares e rios que correm livres aqui dentro.


Choveu sobre a minha capacidade de existir.


elizpessoa

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Sobre essa coisa toda



                                                                 (Foto: Paulo Araújo)


Não é emoção que me falta, sobra sem desperdícios.
Não sou eu que me escrevo,
é outro eu aqui dentro que pede passagem pela minha experiência e se experimenta desfrutando o caminho.

Não é dentro de labirintos que me perco,
me encontro refletida nas retinas do outro, o desconhecido.

Sou um pouco dos desafortunados perambulando pelas ruas da cidade,
e sou muito do trabalhador impregnado da mesmice.

Assombro-me  com a soberba dos desavisados sobre a vida,
e divido-me em tudo que me toca de verdade unificando tudo isso.

Sou um dia após outro, o conta gota das palavras, a moça do sorriso fácil e voz embargada,
o experimento dos sentidos, o subtefúrgio da alma.

E não sou daqui, estou aqui procurando acertar os ponteiros do tempo,
procurando a beleza em meio a imperfeição.

Sou o que em mim padece e a dor da construção, o rasco de instante fecundo,
a palavra gasta sobre a mesa, a descontrução das certezas, outro texto que nasce.

Sou tudo isso e quase nada, a metamorfose da viagem.
Sou a agonia do trânsito engarrafado, o silêncio de um inocênte esquecido pela lei dos homens preso num buraco do esquecimento, a intuição mais primitiva, o afeto vago.

Sou a poesia que se empresta todo santo dia, um ano depois de outro,
a vírgula mais constante das pausas, a moça em mim revelada,
o amigo que mora distante,
o compromisso com a vida.
Esta mesma a qual pertenço!
A vida que se escreve em mim, como a flor da tatuagem na pele queimada.
Sou enquanto sigo, mas não indiferente à nada.

Por isso tanto barulho, uma espécie de anarquia generalizada,
enquanto tento me enquadrar na normalidade amoral das convivências,
sem mais compreender uma grama dessa parada.


elizpessoa

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

A experiência


                                                              (Imagem fonte: Google Imagens)



Da gargalhada fez-se escuro... silêncio
O tempo se abriu pra dentro,
A palavra perdeu o sentido,
A planta cresceu colorindo o escuro de rosa.
O instante fecundo,
metamorfose na manhã de domingo.

Labirintos sem esquinas,
Poesia arrebatada.

O universo expandindo-se na unidade do ser.
A loucura brotando numa rosa amarela,
o campo amarelo,
as cores do Ipê amarelo,
a multiplicação do amarelo,
o amarelo, colorindo os espaços vagos do inconsciente.

O ser num instante sozinho, solto em si mesmo.
O tempo do verso em transformação.

A palavra e um sentido.
Ar apertado no peito...
A natureza nos espaços vagos: a contemplação.


O outro.


A emoção derramada em lágrimas.
A metamorfose das sensações.
Nós, o quarto em espelho.

O chacra do coração.


elizpessoa

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Usuário de Transporte Público no Detrito Federal - Parte V


                                                                 (Foto: Google Imagens)



Tem coisas que nos faz questionar nossas escolhas, uma teima martelando na cabeça. Ando assim, colocando em xeque algumas delas, como a decisão de estudar tão longe de casa. O problema em si não é somente a distância de um percurso a outro, mas em especial, a dificuldade que o transporte público enfrente nas grandes cidades. E Brasília cresceu para os lados e preservou-se no avião pensado pelo cara. Mas cresceu tanto e de maneira desgovernada e levou consigo problemas proporcionais ao aglomerado urbano que virou as cidade em volta.

Como não poderia deixar de ser por aqui, o transporte tornou-se um problema, até agora sem soluções plausíveis. Trânsito engarrafado todo santo dia, faixa exclusiva para ônibus que não resolveu o problema, do contrário, congestionamento exclusivo para ônibus e quase duas horas para chegar ao destino. Surreal e completamente imaginável.

Eu que sempre optei pelo uso cotidiano da bicicleta, agora experimento a falta da paciência e agonia de quem mora longe do trabalho no que deveria ser simples: ir e vir.

Soluções existem, mas no caso do "detrito federal", falta vontade e seriedade para lidar com o problema. Anos e anos de monopólio de um tal Wagner Canhedo, quase um Senhor Feudal do DF.

Outro dia disseram que iriam abrir concorrência pública para renovação de 88% da frota de ônibus. Isso se daria em março deste ano, mas que por problemas considerados "técnicos" não aconteceu na data. Estamos (todos) esperando até o presente momento. 

Enquanto prosseguimos a vida segue congestionada, com usuários entupidos uns sobre os outros, carregados como bichos. É como se estivesse fazendo um favor em carregar pessoas. Como se não pagássemos caro por esse serviço e tantos outros. Mas sem tentar fazer revolução somente em palavras, permito "o silêncio que precede o esporro" da canção.

Ontem foi assim, comum de todos os gêneros, gente se empurrando, outros tentando se manter em pé até chegar ao destino, uns espirrando com os vidros fechados, senhoras tendo que pedir licença para ocupar o lugar que seria seu por direito, jovens preguiçosos fingindo dormir para não ceder, falta de delicadeza, aperto e um certo desespero dentro de mim. Aquela falta de paciência típica de um geminiano quando roubam a sua liberdade, me invadiu por inteiro. E o que antes era humor, transformou-sem em escarro onde se suga tudo para cuspir com vontade.

Para piorar a sensação, duas jovens moças resolvem falar pelos cotovelos da vida dos colegas...ops! inimigos de trabalho. Esmiuçaram a vida de cada um deles, falaram dos defeitos, efeitos e um monte de tantas outras bobagens cansativas. Dali, comentaram sobre a opressão que sofriam, das vontades e provocações que sentiam, etc, etc e tal.

Impaciente, me segurei muito para não falar pras duas calarem a boca. Mas vivo numa tal democracia que me dá e dá à elas o direito de falarem onde quiserem. E todos somos obrigados a escutá-las, ainda  contra à vontade. Exausta, me senti como um homem,  com o saco cheio de falação de mulherada. Como cansa tudo isso! Como a vida é breve para se gastar tanto falando água, e como não irão chegar a lugar algum com essa verborragia. No máximo terão realizado desabafos, como o meu agora.

Dentro do coletivo caberiam algumas regras para preservação do espaço de todos. E elas são desrespeitadas. A primeira foi a do silêncio em meio ao inferno do purgatório que se tornou aquele veículo. O problema é geral, é de todos, é meu!

Quando conseguimos sair do terceiro engarrafamento, uma das moças faladeira se despede da outra e desce, enquanto a outra senta-se ao lado de um simpático senhor e começa a falar de Deus, da igreja, da visita que o senhor deveria fazer lá, da glória e para piorar tudo, da paz de Deus. Quem é ela pra falar da “paz de Deus” se ela conseguiu roubar a PAZ de todos ? Em especial a minha!

Hora bolas! A sorte da tal crente da língua quente, é que o senhor ao lado também vinha da família evangélica, pela glória do senhor, como ela diria. A minha sorte é que ela não veio sentar-se ao meu lado para tocar no mesmo assunto, senão ia escutar poucas e boas e jamais roubaria novamente a minha paz num dia estressante.

Cruz Credo!!!

elizpessoa

terça-feira, 11 de setembro de 2012

O cara, a cicatriz e a palavra



                                                                   (Fonte: Google Imagens)


Por volta das 23h15 entra um passageiro. Subiu pedindo ao motorista para entrar por trás. Levantou a camiseta para exibir um corte que ia do pescoço até o pé da barriga. Tudo costurado. O corte era tão profundo que os pontos pareciam dá nó na pele do cara. Cena esquisitíssima.

O motorista cedeu carona ao sujeito, que entrou e começou e puxar conversa com o cobrador e a contar umas coisinhas... Falou do corte, de como acordou no hospital completamente anestesiado, ainda sem entender o que havia acontecido, disse que não sentiu muita coisa, que a parada da anestesia era da boa. Mas em momento algum falou quem causara o ferimento ou como se deu o rasgo. Disse também, que se antes ele tinha a possibilidade de viver até os setenta anos, agora essa expectativa caira para uns 50, e olhe lá! Inquieto, perguntou ao cobrado quantos anos ele tinha, o cobrador respondeu que 28. Sujeito responde: tá velho já, cara! Ele tinha 22 anos, mas estava acabado. Falou que a juventude se achava imune aos fatos, e principalmente a vida, mas que não era, e que a vida dava um jeito de mostrar o quão frágil são as circunstâncias. Em especial, as pessoas. Que tudo é uma ilusão de perspectiva.

Falava com fissura, como quem tenta engolir o mundo numa só palavra. Como quem tem medo de algo, agitado com a vida, fugindo da sombra que acompanhara. A sua própria. Depois, virou-se para o motorista, puxou a corda do sinal, aproximou-se da roleta, agradeceu, dizendo que Deus o acompanhasse. Virou as costas, e só vi o número nove em sua camiseta listrada. Desceu na altura da quatro norte, deixando a lembrança cortante da cicatriz e suas ideias devastadas. Por um triz, enquanto tudo passa.


elizpessoa

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Reciclagem







De tempo em tempo se faz necessário essa limpeza, desocupar espaços no armário, no guarda-roupa, nos discos, livros, revistas e outros badulaques, porque a vida pede passagem, e acima de tudo exige espaço limpo e renovado para novas papeladas, novos escritos e novos pertences.

É tempo de largar o velho, deixa-lo ir como as folhas no outono, e renovar-se como novinhas flores dos Ipês Amarelos carregadas pelos ares da Primavera.

Ainda falta muito o que fazer, porque com tudo que se deixa, deixamos que vá uma parte nossa que não cabe mais em nós. E as guardamos apenas na memória da existência.  Porque cansamos de muita coisas, de nós mesmos, cansamos do trajeto repetido todos os dias. Por isso é importante um passo novo, ainda que seja no dobrar de uma esquina antes não dobrada. Tentar de uma forma ainda não experimentada, arriscar sensações ainda não sentidas, enquanto o tempo pede passagem, e se não o concedermos, ele passa por cima da gente e vai para um lugar bem longe dessa nova realidade.

É tempo de reciclar, doar, transformar e viver outros sentimentos, experimentar a leveza dos espaços vazios, dos armários desocupados, apenas ficaram as roupas, sapatos e outros pertences que ainda utilizamos para atender a um corpo, e nada mais. O resto é excesso e exagero. Quanto as bagagens, apenas as lembranças levamos com a gente, e eu sei que só ficaram as que realmente valham à pena serem lembradas.

Pesos são desnecessários para um vida passageira e acelerada. E a gente passa tão rápido por aqui.
Por enquanto sou eu, organizando a casa de dentro de mim. O resto é só o risco sobre si mesmo.


elizpessoa

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A Cidade



                                                        (Foto, fonte: Imagens Estadão)



Fez o sinal da cruz em frente ao cemitério. Cabeça baixa pensou que houvesse um igreja no caminho. Igreja não havia, apenas a morada dos mortos da cidade.

Delicadamente os dedos deslizavam sobre a tela touch screen do celular, procurando por alguma programação em algum acústico alternativo da cena da cidade.

Nós por nós nas ondas do som de um certo Câmbio Negro durante os graves da periferia. Muros pichados, palavras ilegíveis desenhavam-se em outros códigos da cidade.

Uma canção pedindo para alguém voltar para um outro ninguém, a linda voz da moça Ana Reis, o samba com cara de tarde domingo ensolarado na cidade.

Uma ponte, o asfalto lá embaixo, duas setas apontando caminhos e um lugar que um dia fora mato. Outra voz reverberando dentro da gente. Uma pausa para a Voz do Brasil, e agora sim, uma igreja santificada pelo sinal da cruz do menino. Um certo tique nervoso e benzedeiras pela cidade.

Outras notícias sobre A Copa da Confederações. A cidade.

Um surto de propaganda na traseira do ônibus, dizia:

"Sabia que um porco ejacula durante 30 minutos?
E você aí se sentindo o máximo. Vá para o motel xxyz".
Delírios e mal gosto de tanta publicidade!

A cidade carregando de tudo isso.
Música de praia, delírios de algumas superstições...
Dai-me paciência para esperar as cores da Primavera.

A cidade, o minuto, o caminho.


Já é setembro aqui dentro!


elizpessoa

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Segunda-feira



                                                                         (Fonte foto: Google Imagens)


Era apenas uma segunda-feira, como tantas outras, onde aquela preguiça exacerbada de tudo tomava conta da essência da gente. Ressaca da noite dormida em picados, da vontade de deixar o despertador tocar mais um zilhão de vezes de cinco em cinco minutos, em dozes altamente homeopáticos. Decidi resolver as coisas, correr atrás do tempo. Esvaída de mim e quase cega, corri por outros atalhos dessa cidade fadada à rotina.

Saltei do ônibus na plataforma inferior da rodoviária, me misturando ao turbilhão de outros trabalhadores, tudo ao mesmo tempo agora numa simples manhã de uma nada modesta segunda-feira. Eles, abandonados a própria vontade de não cumprir regras, de se perder repentinamente, dormiam um sono pesado e absurdo. Largados na calçados como indigentes, lembravam os personagens de Gutiérrez. Secos, sujos, maltrapilhos, mal amados, fedorentos e completamente inocentes em sua perdição. Para onde o mundo dos sonhos os levaria além de tudo isso? Não sei, e de fato não sei muito sobre as coisas. Há muito que as deixei como coisas que são.

Eles eram como coisas ali, objetos humanos adormecidas no asfalto. Pernas abertas, uma sobre as outras, escrotos à mostra, indecências... A privacidade ao Deus dará. Dois homens e uma mulher, serem inacabados pela vida que escolheram e que os encolheram de vez.

Em transe os operários do sistema, seguiam suas rotinas de formigas obreiras, atravessando ruas, pegando conduções abusadas, caras e desonestas, pagando um alto preço por suas escolhas, olhando a vida como uma rotina que cega a gente. Pra mim o pior não era às cegas e obedientes formigas que trabalham, porque elas em si somente seguem. O maior problema era o meu olhar sobre o mundo. Olhar angustiado, apertando um nó na garganta, olhar de tpm feminina, onde tudo fica bem mais sensível e evidente. Olhar que não para de provocar muitos pensamentos, deturpar ideais e questionar a si mesmo.

Eles, largados às ruas, desistidos do destino, de linhas traçadas e retas, experimentando a vida em lugares comum de todos os gêneros, sedentos de mais pedra, mas ópio e mais nada. Vivo como mortos sobreviventes da guerra que nos tornamos quando nos transformávamos. Que guerra é essa? Que carapuça foi essa que vestimos sem perceber que havia dor? Que monopólio foi esse, impostos sobre nossa existência?

Indecentes, vulgares, sujos, mendigos, que não mais são enxergados, onde os governos preferem escondê-los, enquanto o mundo brinca de falar sério.

Pensei no sete de setembro e toda a putaria da festa. Provavelmente arrumarão um jeito de escondê-los no dia. Mas eu preferia que eles estivessem à mostra, como os vi nesta manhã de segunda-feira. E como cenário, poder exibicionista da minha Brasília, um tanto incrédula diante aos fatos.

Gostaria de vê-los fedendo em meio as trabalhadores, para que assim incomodassem um pouco mais outros olhares. Quem sabe encontraríamos um pouco da verdade que não se esconde do mundo, enquanto nos enganamos no simples e desonesto: não é nada, tá tudo bem. É só o mendigo, e só.


elizpessoa