Ele fala ao celular,
caminha de lá pra cá, absorve a fala do outro, acalma a própria voz. Caminha.
Aqui, o vidro está
sobre o olhar que insiste em observar o adesivo, enquanto ele (ainda) passeia.
Não há o que escrever, nem ao menos o que dizer, mas ainda assim arrisca-se por
outras palavras, ondas de falácias.
Percebo o mundo lá fora
e aqui dentro sobra espaço e divagação, enquanto a semana divide-se ao meio,
anunciando outras passagens dilaceradas do dias que se vão sem dizer pra onde. E
pensando no tempo, a Primavera resgata outras sensações, com seu ar feminino,
com suas multiplicas e coloridas cores, flores e outros artifícios, que agora
só existem aqui. Quanta poesia cabe numa só estação? Quantos Ipês já não mais
esperam por ela para se desnudar por inteiro?
A quando se pensa que
não há muito o que escrever, um abraço não esperado surpreende a escrita e
reescreve o roteiro, que segue sem curvas buscando o amanhã.
A palavras não se gastam
enquanto a experimentamos. O que se dissolve é o que havia dentro da gente
enquanto ali vivia. E o afeto, o aperto, a alegria, a sintonia das coisas que
são perecíveis, como a rotina da gente, se enchem de sentido quando escuto
aquela canção descomprometida e inteira em divisões.
Escrevo para não dizer
absolutamente nada, para estar presente aqui, neste absurdo um tanto extraordinário.
Escrevo não por mim, porque não sei escrever com maestria. Escrevo pelo outro
que mora aqui, que vive ali, nas ruas, avenidas e lixos da cidade. Escrevo pelo
outro que não vive em mim, que não vive em si, que não vive em nada. Escrevo
para remediar as avaliações, amenizar os fatos, para carnavalizar essa bagunça
toda que não cessa numa só inquietação. Escrevo pela imagem que nunca
fotografei, pela fala que nunca empurrei, pela malícia enclausurada nos
rabiscos entorpecidos no papel. Escrevo para ouvir outra canção e engolir o
juízo.
elizpessoa
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