quinta-feira, 8 de março de 2012

Dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2012




(Foto Eliz Pessoa)

Descansada me arrumo, pego a bicicleta e ao abrir a portaria do prédio, o vizinho bonito do edifício da frente, desce com um buquê de flores coloridas. Observo-o e tenho outro olhar de retribuição. Desviando a vista, quase tropeço num morador de rua adormecido ali. Sujo, mal cheiroso e largado. Seu sono profundo não casava com a manhã: umas flores e um maltrapilho, paradoxos dessa vida latente em duas imagens impregnadas na gente.

Em frente, o vento me intimidava indicando mudanças no céu, mas nada com o qual eu não soubesse lidar ainda que me encolhesse disfarçadamente. Movimento constante dos carros, pessoas perambulando de lá pra cá, a bicicleta disputando espaço no caminho, óculos escuros para esconder a expressão.

Uma esquina, um veículo e um motorista. Via única e sentido acertado, diante da prioridade que ali é minha. Segura, segui sem colocar os dedos nos freios da “magrela”. Ele, certo de suas ideias contagiosas me mira, entra com vontade na avenida e desacelera o carro. Rapidamente aciono os dedos afoitos no freio, controlando a bicicleta. Ele, com um sorriso sarcástico, me olha via retrovisor expressando um ar de contente. Aqui, sobre duas rodas frágeis o sangue esquenta e a língua cossa, enquanto a cabeça tenta direcionar os próximos capítulos da minha ação. Mas a razão perde o juízo e observo o desenrolar do movimento do motorista, que entra à direta, estaciona do lado de fora e depois me observa com aquele mesmo sorriso intransigente. Esquentada me expresso: “Babaca!”. Ouso sem perder o controle da bicicleta ainda em movimento. Saio resmungando como se assim eu pudesse modificar os fatos. Não os modifico, continuo esquentada e perturbada... Penso em milhões de coisas que eu deveria ter dito a ele. E dentro de mim um anjo sensato denominado razão, tenta recobrar minha consciência e me pede calma, me fazendo enxergar as coisas e me dizendo, que o que eu gostaria de ter dito para o cara, poderia trazer uma repercussão mal sucedida, como a vingança estornada do motorista em minha direção. Visualizo as ideias como num desenho de animação. Logo me lembro do personagem Pateta, num dia de trânsito. É bem daquele jeito que me senti, louca de raiva e cega dos atos.

Sigo meu caminho rumo ao trabalho. Dia Internacional da Mulher e essa foi à primeira reação que recebo! É por isso que sou contra o dia Internacional das Coisas Gastas! Todo dia era dia de índio! Todo dia deveria ser das mulheres, dos homens, das crianças, das mães, dos pais, dos sem terra, dos sem teto, dos sem nada. Todo o dia é dia santo. Nossa Senhora do Perpétuo, Socorro! Não há que se tratar melhor as mulheres por ser o dia delas, não há que se tratar o ser humano, assim como os animais porque se trata do dia deles.

Todo o dia é santo e todo santo dia eu pego minha bicicleta e faço o meu percurso. Todo o dia alguém se prevalece desfavorecendo alguém em alguma coisa. E o Dia Internacional da Mulher - um dia - deverá deixar de existir e todos os dias serão nossos, sejamos belas e feias, inteligentes e burras, de família e abastadas, com e sem dinheiro, com e sem saúde, mães e solteiras. Todos os dias serão de Vênus.

eliz pessoa

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