segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Um desenho...


Foto: Internet

É porque ela se vê dentro dos olhos dele, quando ele se deita sobre meus seios, depois silencia a língua nas gotas salgadas da saliva. É quando acordam nos sons alegres de passarinhos, tons e semitons regem a melodia do dia.

De outra forma, um samba da viola de um Paulinho, invocara a manhã por inteira, enquanto um café é posto sobre a toalha vermelha da mesa.
É domingo, pé de cachimbo.

Mas ela havia (mesmo) jogada nos braços do mar do Arpoador, todas as despedidas do um tempo farto em si, como poemas que nos deixam sozinhos sem dizer adeus.

A lista (agora) não mais de supermercados, rabiscada de novos desejos embrulhados em papel de caderno, cuidadosamente dispersa ao mar, doadas nas mãos de Yemanjá, recebiam um coração de Oxóssi.

Entregue as curvas da cidade maravilhosa, ela já o esperava, mas ele a encontraria quando seu coração tornara-se um nobre vagabundo, como anjos que despencam do céu. Se bem que ela já não acreditava em asas quebradas.

Em forma de desenho, ele a encontraria numa esquina de uma cidade qualquer, bem longe dos braços rendidos do Redentor.
E assim, um sentimento se fez em rabiscos e a palavra emudeceu o pensamento.

Eles se encontraram e foram perdendo o medo do escuro, da rua vazia, das distâncias não galgadas, das multidões repletas de solidões que se acompanham em si, da casa calada, dos outros amores infundados, dos receios carregados, das horas e horas de indiferença que os dias pintaram em palavras.

E assim, uma nova dança uniu dois novos corpos, como peças que se encaixam, fundem-se, fodem-se e findam-se no encontro de almas.

Por enquanto, seus mais sinceros desejos foram compreendidos pelos os sons do universo. Agora eles conspiram a construção de uma nova poesia, redigida de toques, linhas de mãos e labirinto dos dedos.

O encontro criou o caminho e alguns laços viraram presentes enfeitados dentro de uma caixinha de surpresa. Quando a vida pediu passagem, eles aceitaram o convite proposto dia-a-dia.

Um novo livro supõe novas existências, partindo do princípio chamado agora.

Já é segunda-feira e há tanta poesia lá fora.

: : eliz ::

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Cadê os óculos do poeta?

foto:
Carlos Levistrauss


Nos buracos da cidade transitam ratos, baratas, “baratos”, insetos, incestos, felinos, até alguns calangos trocaram a liberdade do gramado cerrado por ares do submundo urbano. Como no fundo do mar, debaixo das metrópoles, um novo mundo, vivo debaixo de nossos pés.

Em meio ao caos, a vida se expande e deita-se na grama, sobre o sol raso dos dias quentes. Enquanto o trânsito orienta os sentidos, outros ouvidos carecem de música.
Os mp3 enfeitiçam a paisagem que passa e num instante as avenidas parecem saídas de um filme de cinema.

“Cansei de ser duro, vou botar minha alma a venda” canta o caçador, cansado de ser caça. E a Yôga, ainda assim, alonga a coluna do indivíduo, estreitando os laços da energia bloqueada na loucura dos dias.

Muitas morenas desfilam suas feições nordestinas nas asas abertas da cidade. Reflexo da genética abrasileirada. À flor da pele, um samba descompassado de Almir Guineto traz memória de um Chacrinha envelhecido nas tardes de sábado. E o carnaval ainda nem pintou por aqui.

Sem muitas palavras, o olho de um anônimo, observa a vida que lida na gente.
Sutilezas na nuca das meninas lá fora, intenções denunciadas pelos gestos, enquanto a mão do faxineiro alisa a pele da parede.

Limpidamente, o bloco vai ficando mais bonito, trabalhado pela forma das coisas.

Por aqui, poucos corintianos exibem suas camisas de uma nação supostamente democrática. Suspeito de tudo isso e ando (sinceramente) com medo da polícia, sem (ainda) fazer coisas “erradas”. Depois, desconfio de qualquer conversa de Jornalista, enganando como a torcida dos caras.

Paraliso a leitura do jornal de uma banca qualquer, pois transformaram o trabalhador morto, num mau elemento “graças” a eles, menos um no sistema.

Algumas vertentes aumentam o grau de minha miopia, e ainda assim, nego o uso das lentes de vidro, porque por vezes nem quero enxergar melhor. Como Drummond nas calçadas, descalçadas pelos gringos europeus que visitam o país das mocambas, mulatas de bundas redondas. Depois que roubaram até os óculos do poeta. Talvez nem ele queira ver no que nos transformamos.

Mas ainda cabem processos galgados pelas pernas que correm dos bandidos, como “Trainspotting” de um filme assistido.

Ando tão a flor das ruas, que qualquer cena desvairada me faz pensar...

Mas devolvam ao Drummond os óculos, pois ele já não enxerga mais, além de tudo que avistou em sua poesia: “Existe, existe o mundo apenas pelo olhar que o cria e lhe confere espacialidade?” Concretitude das coisas.

Em meio a tudo, falácias...

:: eliz ::

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Coração

foto: Rui Soares


Meu coração bate, rebola, depois dança ao som de muitas canções.
Meu coração é tão pequenino e cabe tanta emoção, outros esforços físicos, pulsações.
Nele, o mundo se encontra como nas ruas da cidade provinciana.

Meu coração é tão vadio por isso mesmo poeta de múltiplas rimas, ritmos e prosas.
Meu coração é carioca, brasiliense, nordestino, labirinto estranho no raso do peito.

Meu coração nunca foi meu, nunca teve dono, apenas se perdeu quando outro nele se encontrou.

Latino, latido, perambulando lá fora.

Meu maior tesouro, minha menor miséria.
Minha poesia, meu nada.

Meu coração é um porto sem rumo,
Um forte abandonado,
Uma estrela cadente perdida no escuro da noite,
Encontrada nos olhos delas.

Meu coração não é um coração, mas um músculo repleto de saudades...



:: eliz ::

sábado, 20 de outubro de 2007

Latejando saudade...

Ele havia me pedido um livro para guardar de lembrança da poetisa,colega de trabalho.
Eu havia dado minha palavra em entregá-lo quando exemplares chegassem as minhas mãos magras.

Mas ele também era um poeta, cheio de fislosofias, frases feitas, provérbios, bom humor lapidado pela vida, vasto coração cearense. Como tantos brasileiros, trabalhador, pai de três filhos muito bem amados. Acima de tudo, alguém que a vida, por alguma circunstância, colocou no nosso caminho. Peça rara, original, autêntico em sua essência cheia de alma brasileira.

Eu não sabia que uma ruptura o tiraria do meu convívio assim tão absurdamente estúpida, como uma lança cortando nosso carne. Mas como ele a pólvora de nossa polícia mal preparada, foi o estupim que levou sua vida de nosso vivência.

Amargamente ele partiu ontem, no entorno torto dessa “ilha da fantasia” que se tornou Brasília.
E os lados planos das estatísticas gritam todos os dias calando Chicos, Joaquins, Josés, Marias, Antônias, rasgando a poesia que vive nessa gente, comum de todos os gêneros, cronicas de nossas ruas no dia a dia.

O Estado já falho, provou sua incapacidade nos seus senhores da lei. Deslealmente o arremataram a queima roupa, em plena sexta-feira, onde ele dizia que queria tomar uma cerveja pra celebrar a semana posta.

Estranhamente, eu havia na quinta-feira xerocado uma cópia de um texto da também cearense Raquel de Queiroz – Emigrantes, onde a escritora dissertava um pouco da colonização do Ceará de onde ele foi fruto, filho nato das raízes da terra.

Bom humor, piadas latejando na ponta da língua e um jeito de olhar a vida com uma certa sabedoria de quem já passou por muitas provações. Corajoso por luta, nunca abaixou a cabeça nem se acovardou quando ela o chamou para a lida.

“Pequenino (batoré), cara de índio, entusiasmado, cabeça chata.” Brasileiro.

Hoje, arde a perda, a dor de amigo querido, do qual tive o privilégio de dividir bons momentos, muito trabalho e o um carinho tão especial, acima de tudo sincero.

Ao meu amigo de trabalho, querido Nonato do Ceará, sangue de minhas veias também cearense, a minha mais sincera lembrança e a grande saudade latejando no peito quase adormecido pela dor.

Seu livro (prometido) virou poesia e minha eterna admiração...

Vá com Deus... E aqui, fica sua lembrança descontraída.


foto: Internet (anônima)


: : eliz : :

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Sangue, suor e palavra



Foto: Internet




É o cheiro da pele na pele, outros absurdos.
Dedos escorregando os fios de cabelos,
Malícia revelando rabiscos e desejos.
Devassas palavras ejaculadas no ouvido...

Corpo nu auge da noite,
Sabores experimentando segredos,
Pêlos e pernas entrelaçadas,
Sensações desvairadas,
Olhares invasores,
Afã de desejo

Umidade latejando sentidos...

Mãos desavergonhadas e sons de Zeca Baleiro:
“feliz ao lado desse bom divã”

Horas no outro, saliva de sêmen, sabores apimentados em nós.
Oráculo de prazeres: sangue, suor e palavra.
Língua no seio lambido... Por entre pernas, corpo no corpo.

Atmosfera escancarada, vento da noite encontrado em nós.

E o mundo adormece, onde o corpo se encontra.

Mas fica mais um pouco, antes que o dia amanheça?



:: eliz ::

segunda-feira, 15 de outubro de 2007


Dentro de mim há uma Bahia,
outro Recife,
um Rio correndo livre
envolto por montanhas de ares femininos.

Dentro de mim, pulsa tambores de carnaval,
folia de rua, cores e alegrias...

Dentro de mim há um Brasil festeiro,
confusão generalizada e muitos reboliços...

Por aqui a vida pede passagem,
depois passa deixando ratros nas ruas da cidade.

: : eliz : :
foto: Pedro Moreira

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Eu sou de Oxóssi

É essa sensação cravada nos rascunhos do peito, quando todo "controle" se expande no decorrer dos dias, causando impressões ligeiras de traquilidade.
Tudo parece amortecido pelos atalhos da lida.

Mas o tempo, também nos engana virando páginas mais páginas dos dias. Reencontrando tardias vontades como se elas nunca houvessem transcorrido.

E respeito cada uso da palavra, cada estrela vaga, cada vírgula que tropeça o caminho.

Depois não há mais nada, pois não entendo mais nada e perco a sábia ignorânia do desconhecido, lançado aos braços da vida - roda de ciclos, imperfeitas purificações nas muitas ondas do salgadas do Atlântico, onde os olhos recordam saudades...

Mentalizo e ofereço uma oração à rosa recolhida pelos braços do mar.

Mas eu sou de Oxóssi, da caça e fartura "caçadora de uma flecha só" de São Sebastião do meu Rio de Janeiro, São Jorge de um coração guerreira. Por isso mesmo, não me canso e não me deixo nas argruras do peito.

Sou da luta, mesmo quando a poesia se derrama nas escadas da calçada, ainda quando tudo parece rendido nos vastos sorrisos de mentes cansadas.
E arrisco um risco novo, transformo o caminho e me rendo quando a noite cala.

Há tanta vida na gente e a gente se esquece disso...

: : eliz ::

foto: Rui Pedro Santos Duarte

sábado, 6 de outubro de 2007

Há tento tempo...


foto: Ana Franco



Porque a palavra quando não basta, serve de apoio à ponta da caneta gasta.
E fica difícil contar o que não se sente, o que não se experimenta na gente.
O risco admite as nuances do caminho, mas ainda te canto, mas não de conto acentuando sensações.
E hoje os Beatles te resgatam de um naufrágio musicado em mim.
Mas, se bem que, depois que o tempo mudou a alforria das coisas, esse som impacienta-me o ouvido.

Faz tanto tempo que a gente deixou algo esquecido, recolhido nos resquícios de uma só lembrança...
Como a roupa esquecida no varal de fora da casa, na pressa descritiva dos dias, meses, e que alguém levou, sobrando aqui dentro a vaga sensação do vazio.
Há tanto tempo, que eu já devia ter te esquecido, como a última palavra vaga ao final da linha.
Depois de tudo, o prêmio, resistindo a certeza do carinho, e os ruídos de Hendrix que naufragam você.

Numa estúpida velocidade, as mudanças cortaram a passagem de pés descalços, sem sequer perguntar-me se as queria, nem se importou com as coisas as quais, atribuía algum tipo de valor importado.
Ditando novas regras de um jogo que eu não escolhi jogar.

(A vida é feita de escolhas)

Revendo delírios em tantos grilos, gritando dentro de nós.
Agora, respingam desabafos escondidos nas horas de silêncio.
E ainda resiste a miséria disseminada nas vozes das ruas, quando alguns velhos sem amparo (ainda), zelam por possibilidades de esperança.
Milagrosamente, insiste na cegueira da fé, indispensável sobre as curvas do caminho.

Estranhamente, derramo algo novo, resquícios de um mundo caduco, consumindo de tantas verdades.
E recolho-me na essência camuflada sobre a pele, mais próxima de minha morada.

Texto: eliz pessoa