quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Sobre um trago e o pensamento




Atravessou a rua sem olhar ao lado, esqueceu-se do sentido raso das coisas corriqueiras. Pensou novamente, e por um triz, o asfalto molhado sobre seus pés escondidos.

Cidade larga de horizontes estreitos. Coçou a cabeça, fingiu que não percebeu, seguiu em frente. Atropelou-se em outro pensamento, uma ideia escondida. Escutou a canção que lhe contava algo indecifrável por seus conhecimentos. Puxou um maço de cigarros do bolso da jaqueta, procurava por um alívio imediato. Ascendeu o cigarro e o tragou fundo, como quem tenta um novo suspiro sobre o vento. Olhou para o céu, para o lado. Percebeu a velocidade das pessoas em sua volta, queria esquecer tudo isso um pouco.

Tragou mais duas, três, quatro e cinco vezes repetidas. Experimentou certo alívio no entorpecimento. Engoliu a seco uma saliva passageira, sentia a garganta ressecada. Tragou novamente. Não tinha certeza de toda àquela agitação, daquele verbo. Não tinha muito tempo para resolver suas pendências, refletiu. Quem o tinha?

Era tarde de um dia repetido pela primeira vez... Outra semana, a única entre tantas unicidades. Mais era a mesma coisa, do mesmo sempre, de todo dia. Era o atalho sobre si mesmo. Tentava sem muito esforço, mudar o hábito. Diziam que vinte e um dias era o suficiente. Para quem?

Queria mesmo acordar mais cedo. Lá pelas seis da manhã, tomar um banho frio, despreocupada. Um café preto e um pão com manteiga, vestir a roupa, outra sapato e sair sem pressa para enfrentar a lida. Mas teu sono, teus sonhos, sua preguiça eram reis. Mandavam e desmandavam. Sabia que eram possíveis e plausíveis teus significados, mas também conhecia o poder de uma ação imperativa. Ela tinha que mudar tentar diferente, começando pelo sono.

Queria ler outro livro, se apaixonar por outras palavras, ainda que desconfiadas e inconfiáveis. Não havia tempo pra duvidar das coisas, não havia por que tantas interrogações. Era ela, sua cabeça e o mundo presente numa caixinha de surpresas. Se o mundo iria se acabar, ninguém sabia, nem ela. Mas pensou ironizando todas as profecias: era sim, dia vinte e um de dezembro de dois mil e doze, em plena sexta-feira, um bom dia para se celebrar numa festa, que chamaria de “Festa do Fim do Mundo”. Morreria ao menos feliz ao som de uma música, cercada de pessoas bebendo cerveja, experimentando um pouquinho de novos sorrisos.

E se, de repente, o mundo findasse ali, partiria sem menos grilos e deixaria um mundo bagunçado, se o todo poderoso assim permitisse.


eliz pessoa


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