(Foto: Eliz Pessoa)
O telefone tocou. Do
outro lado, ela, um tanto quanto diferente do habitual, ergue a voz dizendo que
uma cena de guerra instalara-se na W3 Norte. Um tanto sem acreditar na
imposição de sua voz, ainda mais porque ela não é de agir assim, muito pelo contrário,
sempre usa de equilíbrio e ausência de exageros para dizer algo, e por essa
mesma razão foi que a levei a sério, porque ela é dada a seriedades.
Não satisfeita, me
convidou para descer e ver de perto o caos. Não pude negar seu pedido e nem
anular minha curiosidade. Saímos a pé, cabelos ouriçados pela natureza, calças desbotadas, óculos na cara para enxergar melhor o problema, que até então, só
fora lembrado pelo vento forte na janela, pelo peso da água sobre a morada, pelas cores escuras do céu, pelo o dia que virara noite tão repentinamente e pelo estrondo
de um único e sincero raio que caíra sobre alguma parte da cidade, bem perto
dali.
Teria sido o raio que arrancara as árvores da avenida, ou, o vento e toda a sua intensidade resolvera mostrar
provas de suas habilidades de vento?
Quando lá chegamos, ela
havia sido arrancada pela raiz, levando consigo uma vida inteira de árvore, que
leva um tempo para amadurecer completamente. Talvez por essa mesma razão, ela
tenha se dobrado aos artifícios do vento, deixando-se render por inteira.
O fato é que venho confessar minha
simpatia pelas árvores. Aprecio a generosidade delas e sempre as vi com bons
olhos. Não é à toa que a revolta das árvores que se passa na história do Senhor
dos Anéis tanto me agrada. Mas na vida prática, elas não podem arrancarem-se do
chão e seguirem proclamando independência, pois acostumaram-se a fincar raízes, nem
tão profundas assim, como no caso das que residem na W3. Nasceram sobre o elemento
terra e sempre exigiram praticidade e firmeza para enfrentarem anos erguidas, lutando contra a lei da gravidade.
Ela caída fechando a
avenida, os carros desviando sobre as calçadas e o formigueiro de curiosos
saindo dos buracos, como ratos atrás de queijo.
Nós humanos, sempre
afoitos por alguma novidade, saímos às ruas. Alguns se sentiram jornalistas do
caso da árvore vencida pelas ironias do vento forte daquela chuva repentina e
começaram a filmar com celular e a relatarem o caso. Outros aproveitavam para
postar nas redes sociais o acontecido. Um flamenguista fez questão de
posicionar-se próximo a raiz apontando para ela, enquanto outro sujeito sacava
uma foto, fazendo do caos uma grande distração momentânea como quase tudo por
aqui.
Logo a imprensa chegou e a notícia se espalhou junto aos curiosos.
Transformando aquela tarde de sábado numa grande atração, sem artistas,
nem palco. Apenas um morto, a árvore. Somente ela, no singular em meio a tantos contra tempos.
elizpessoa