Foto Estadão, fonte Google Imagens
Dia a dia, passo a passo, caminho
do mesmo. Mas nem sempre as repetições se apresentam. Hospital público e muitos
pensamentos naquela cabeça de mulher. Como medir a diferença entre a sua dor e
a dor dos outros? Tantos deles. Aqui é fácil diminuir o seu problema, medir por
atalhos confusos. Daqui e dali, um olho enfaixado, outra perna amputada, uma
cabeça raspada, entre passos cansados e um olhar censurado pela presença de um
corpo esquecido numa maca. Muita gente simples, doente e aquela sensação
atrasada do tempo que se perde na vida da gente.
Sentava a moça observa e pensa,
exercita sua paciência esperando como todos ali. No vai e vem da sala dos
médicos, representantes de produtos farmacêuticos entram, passam um tempo e
saem levando consigo o tempo daquelas mulheres envelhecidas no banco de espera.
Ela pensa no absurdo daquela espera toda. Não poderia estar certo, e
experimenta certa sensação de infração à saúde alheia. Pensava também em
tributos, impostos, taxas administrativas, absurdos de um país que acostumou e
envelhecer mais rápidos sua gente. Que se acomoda na indiferença da burocracia.
Quanta dor ainda escondida em meio aos seus tramites infinitos?
Fechou os olhos, encostou a
cabeça na parede e silenciou. Mas aquela quietude disfarçada foi quebrada pela
voz de uma senhora de cabelos brancos, que comentava sobre a demora naquele banco
de espera. Não satisfeita, relatou seus problemas de saúde. Sofria de diabetes
das mais perigosas, pressão alta fora de controle e depressão controlada por
remédios. Disse que seu caso precisava de acompanhamento de três em três meses,
mas que já fazia um ano que não conseguia consultar por conta daquelas questões
expostas acima. Era visível uma espécie de “orgulho” em seu modo de falar sobre
sua doença. Como quem diz: “olha, meu problema é serio por que carrega muitos
superlativos.” Bem, ao menos foi assim que a moça fez a leitura em sua
expressão.
É fácil perceber que seu problema
é miúdo perto de outros tão maiores. É fácil até sentir-se mal diante de tudo
isso. Só não é fácil perceber o descaso das autoridades diante ao seu povo. Descaço
esse, que se enxerga fácil ao ver a dureza dos profissionais de saúde, ao lidar
no atendimento aos doentes. É claro também que não há por que generalizar
coisas, muito menos pessoas.
Em meio ao “holocausto” das
enfermidades dá para perceber alguns gatos pingados fazendo alguma diferença. A
moça com seus olhos já cansados avistavam quatro mulheres vestindo camisa rosa,
andando pelos corredores do hospital, distribuindo café, chocolate e pão, além
do sorriso agradável no rosto. Evidente que quem ajuda se ajuda acima de tudo, e essa seria a grande lição daquela
oportunidade. Não é fácil viver em meio a um turbilhão de flagelos, e tem muita
gente que vive assim todo santo dia, embora nem todo dia seja santo.
elizpessoa